Não é a primeira vez que se diz isso, mas seria desejável as pessoas manterem uma relação menos passional com as pesquisas eleitorais. Seria desejável mas é impossível. Ao trazer o desfecho das urnas a valor presente, antecipam-se estados de euforia e depressão que costumam caracterizar o posfácio da eleição. É emoção pura. São amor e ódio garantidos.
O habitual, por isso, é as pessoas amarem as pesquisas boas
para seus candidatos e odiarem as ruins. É um direito. Mais prudente,
entretanto, seria tentar olhar os números com algum distanciamento. E há um caminho:
em vez de repudiar as pesquisas, ou acreditar só em algumas, melhor tentar olhar
o que têm em comum. Inspirar-se na lei dos grandes números.
Segundo a qual, quanto mais vezes você repetir a mesma
experiência, mais a média dos resultados tende a aproximar-se do resultado
esperado.
Vale em algum grau para as pesquisas feitas pelas diversas empresas do mercado, ainda que haja distintas metodologias, e por isso não dá para falar, a rigor, na repetição da mesma experiência. Mas uma leitura mais flexível e menos rigorosa da regra é legítima aqui: quanto mais pesquisas você olhar, mais improvável que os traços em comum de todas estejam errados.
O que dizem todas as pesquisas? Hoje, 1) Luiz Inácio Lula da
Silva está à frente de Jair Messias Bolsonaro. Mas, 2) este vem encurtando a
distância, reagrupando principalmente o eleitorado dele de quatro anos atrás, porque 3) o quadro geral na saúde e na economia apresenta
alguma evolução e 4) o contingente que rejeita o PT não encontra alternativa
crível.
Onde está o coração da corrida eleitoral? Tentar descobrir
qual é exatamente o eleitor em disputa. Pois as energias e os recursos escassos
das campanhas precisam ser alocados para onde podem render voto, ou ao
menos tirar do adversário, e não para malhar em ferro frio.
A mais recente pesquisa BTG/FSB trouxe Bolsonaro com 30% de
intenção espontânea. Na margem de erro, corresponde ao que ele reuniu
no primeiro turno quatro anos atrás, pouco mais de 33% do total do eleitorado.
Por que a comparação tem de ser com o total? Porque as pesquisas não abrem o
questionário perguntando se o eleitor vai votar ou não.
Lula, no momento, vive uma estabilidade. No voto
espontâneo, consegue 36%. Reúne o eleitorado duro petista e lulista que levou
Fernando Haddad ao segundo turno em 2018 (pouco mais de 21% do total dos
eleitores), mais um pedaço dos nem-nem de quatro anos atrás e mais um tanto de
gente que só aceitou Bolsonaro quando a opção era o PT.
É razoável interpretar o comportamento desses dois últimos
grupos com uma função direta da rejeição ao atual presidente. Ou seja, o desafio
colocado para Bolsonaro hoje é um só: diminuir a rejeição. O que pode ser
buscado reduzindo a própria ou aumentando a dos adversários, principalmente a do
adversário principal.
Tentando fazer com que este seja mais rejeitado que o
presidente pelo eleitor flutuante.
Dilma Rousseff reelegeu-se assim. Em setembro de 2014 seu
bom+ótimo estava em torno de 35%, mas uma campanha duríssima contra os
desafiantes, Marina Silva no primeiro turno e Aécio Neves no segundo, fez mais
gente acabar rejeitando os adversários do que o contingente que não queria
saber da reeleição da petista.
A Dilma de então levava uma vantagem sobre o Bolsonaro de
hoje: não recebia tanto ruim+péssimo, tinha um estoque maior de regular. Mas
nada impede o atual presidente de trabalhar para chegar a setembro com uma
parte do hoje ruim+péssimo transferido para o regular. É o que os adversários vão
tentar impedir.
Se Bolsonaro ganhou quatro anos atrás e Lula lidera hoje, ou 1) uma parte expressiva do não-voto em 2018 (brancos+nulos+abstenção, pouco mais de 27%) inclina-se ao petista e/ou 2) um pedaço significativo dos antes eleitores do capitão hoje respondem “Lula”.
A primeira hipótese parece menos ponderável para projetar o resultado de outubro. Pois o não-voto tem se mantido algo estável na série histórica.
O principal desafiante e o incumbente disputam, centralmente, alguém que já tinha votado no PT, aí votou em Bolsonaro, agora
está bravo com este e tem à disposição um produto já testado, um ex-presidente
que saiu bem avaliado do cargo. Mas, atenção: quem já votou em Lula e também já
votou em Bolsonaro não enxerga uma barreira intransponível pera acabar
escolhendo qualquer um dos dois.