segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Em que medida a Era Lava-Jato impulsiona as medidas de austeridade da Agenda Temer

O senso comum informa que a instabilidade política é um freio à desenvoltura do Congresso Nacional para aprovar medidas de austeridade, pilares da agenda do governo nascido no impedimento de Dilma Rousseff no primeiro semestre deste ano.

Mas, o senso comum ajuda a resolver praticamente todos os problemas com exceção dos realmente importantes. Então vamos à possibilidade oposta: de que a incerteza política possa impulsionar a agenda legislativa sonhada por onze entre dez atores que apostaram na deposição do governo do Partido dos Trabalhadores.

A fraqueza da esquerda debilita a resistência social a medidas liberalizantes e de austeridade. A resistência crescerá à frente, mas no momento é residual. O único vetor a alimentar para valer a instabilidade é o potencial destrutivo da Operação Lava-Jato sobre o mundo político.

Semana sim, outra também, uma ou mais de uma figura de peso do elenco são "esculachadas" no noticiário a partir de 1) um indiciamento pela PF, 2) uma nova fase da LJ, 3) uma denúncia do Ministério Público, 4) uma aceitação de denúncia pelo juiz Sérgio Moro, 5) um vazamento de delação.

Assim, a política vai sendo submetida a um assédio continuado, que a mantém sob pressão. E a pressão é sobre o conjunto, pois o dano potencial visa a todos que tenham recebido, para campanha ou não, recursos de empresas ou pessoas a favor das quais tenham agido, em algum momento.

Será difícil excluir algum político desse amplo critério, daí o crescente consenso no Congresso Nacional sobre a necessidade de buscar mecanismos de proteção coletiva. Eis a maior dificuldade que o MP enfrenta para aprovar suas dez medidas sem alguma contrapartida.

Atenção: não digo aqui que a contrapartida virá, nem se seria "certa" ou "errada". Apenas descrevo as forças em disputa. O MP quer superpoderes para combater a corrupção. O Congresso, pressionado pela opinião pública, até aceita, mas quer que o jogo comece agora. Aguardemos a resultante.

E qual é o vetor oculto (ou nem tanto) nessa soma vetorial? O fato de o Congresso ter percebido que votar medidas liberalizantes e de austeridade ajuda a atenuar o apoio irrestrito da imprensa a que a Lava-Jato pratique um morticínio no atual elenco em Brasília.

Temos comparado o quadro com o de uma cidade submetida a "carpet bombing". Do alto, a destruição é total, e os ainda vivos não têm qualquer garantia de que estarão vivos amanhã. Mas no chão todo o esforço dos ainda sobreviventes é para que a vida siga dentro de alguma normalidade.

Outra comparação útil é com a tática da presa diante da ameaça do predador. Se ela já está no radar dele, e não há onde se esconder com segurança, o melhor é ficar em movimento, e embrenhado na multidão de presas potenciais. Vai que o escolhido para a caça seja outro?

A melhor forma de o mundo político buscar alguma proteção não é mais a exibição de poder, um poder hoje eclipsado e enfraquecido. É tentar sintonia com pelo menos um pedaço da "Frente Lava-Jato" e obrigar o comando adversário a negociar. Nem que sejam os termos.

E a sintonia será mais facilmente alcançada se o Congresso alinhar-se à agenda consensual. PT e satélites até conseguem unir-se contra a agenda, mas não apresentam sequer um rascunho do que fariam no lugar do que vem sendo proposto. Daí o "consensual". E mecanismos de proteção interessam, e bastante, também ao PT.

O resultado está impresso num aparente paradoxo. Nunca houve em tempos recentes (e talvez em todos os tempos) um governo mais capaz de sensibilizar o Legislativo para tal agenda, mesmo ela impopular e mesmo o Congresso e o Executivo mais vulneráveis que nunca a ataques externos.

Dizem que a Lava-Jato atrapalha a recuperação da economia. Mas, se você acredita que o relançamento da economia depende da aprovação da Agenda Temer, talvez seja o caso de pensar na hipótese inversa

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Economia e turbulência na base desafiam o governo, que não tem a inércia a favor

A administração Michel Temer tem ido bem onde havia dúvidas se iria bem, a gestão política, e começa a enfrentar ceticismo onde havia mais otimismo, o relançamento da economia. Mas mesmo na política algumas nuvens ameaçam no horizonte, dado o ensaio de imbroglio na sucessão da Câmara dos Deputados.

As dúvidas na política eram razoáveis, dada a escassez de apoio popular, a sombra permanente da Lava-Jato e a então suposta capacidade de resistência social dos depostos com Dilma Rousseff. O otimismo na economia também, dado o anunciado consenso nacional em torno do que deveria ser feito para relançar a atividade e o emprego.

Na economia, Planalto e apoiadores começam a saborear a realidade vivida pelos governos recentes. A resistência decisiva à racionalidade fiscal não tem estado no desejo de quem governa, mas no entrincheiramento dos governados. Se a aprovação do teto de gastos vai bastante bem, a reforma da previdência anuncia-se complicada.

E vem aí a quebradeira de estados e municípios. Será uma quebradeira "branca", dado que a União vai ser empurrada a intervir em algum momento para salvar da bancarrota. Pois as corporações que parasitam os cofres públicos estão fortificadas nos bunkers da mistificação. A principal delas é que dinheiro tem, apenas vem sendo desviado pela corrupção.

Só que não tem. Os governantes sofrem para vender esse peixe, dado o déficit de prestígio e credibilidade. E também porque a opinião pública está suficientemente alinhada à Lava-Jato para resistir a narrativas destoantes. Mas mesmo se a Justiça acertasse todas as contas com todos os políticos suspeitos, isso não faria, infelizmente, aparecer o dinheiro que não existe.

Estamos num impasse, que freia o relançamento mais decisivo da economia. É um fator que pode vir a complicar a equação em poucos meses. É o tempo que o governo tem para mostrar que está conduzindo o trem para fora do túnel. E disso depende o sucesso político no médio prazo, que para um governo de dois anos é um prazo curto.

Sem ajuste fiscal crível, sem concessões e privatizações aceleradas, o governo Temer passará a ser alvo dos que viram nele lá atrás a porta liberal de saída para a crise. Daí a ser abandonado e ver deflagrada prematuramente a sucessão, seria um passo. E há a novidade Donald Trump, cujas consequências sobre a nossa economia ainda não podem ser precificadas, mas não serão neutras.

Na política, o governo vai bem, com base sólida e ampla, mas tem um desafio mais imediato, que se não for bem resolvido fará o curto prazo político prevalecer sobre o médio prazo econômico. O governo precisa vencer a eleição para a presidência da Câmara dos Deputados e evitar produzir um personagem poderoso contra si.

Não são desafios triviais. O governo tem a faca e o queijo, inclusive pela fraqueza da oposicão. Mas precisa pedalar a bicicleta, sem trocadilhos. Não pode se abrigar na ilusão da inércia. A inércia não joga a favor sempre.

* Depois que acabou a União Soviética e se desfez o chamado campo socialista, a esquerda enveredou pela luta antiglobalização. Mas em algum momento que, sinceramente, não lembro bem qual tenha sido, converteu-se à defesa de uma "globalização do bem".

Com isso, deixou aberto para a direita o espaço do nacionalismo. E por mais horror que o nacionalismo desperte nos espíritos modernos que acreditaram na "globalização do bem", estes fariam melhor se abrissem os olhos à realidade.

Em épocas de crise, as pessoas olham os espaços nacionais como linhas de defesa. Mais ainda quando as instâncias supranacionais se mostram o que realmente são: bastiões de interesses específicos.

O nacionalismo voltou. Para ficar por um bom tempo.

Prestar atenção:

• A equipe econômica de Donald Trump

• Os protestos contra Trump

• A votação no Senado do teto de gastos

• O ajuste fiscal no Rio

segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Na análise da estabilidade, devem-se avaliar com realismo os vetores da instabillidade

Os vetores que estabilizam o governo Michel Temer são, no atacado, 1) a aplastrante maioria congressual, 2) a extrema fraqueza política e social da oposição e 3) a ausência de propostas alternativas para enfrentar a crise econômica. No varejo, 4) a muito provável aprovação do teto de gastos e 5) a anunciada disposição de enfrentar a reforma da previdência social.

Um vetor de instabilidade é a Lava-Jato, com o previsto potencial explosivo das megadelações. Isso faz pipocar no noticiário todo tipo de especulação, inclusive sobre a eventual substituição presidencial. Há aí algum exagero porque 1) Temer não pode ser investigado por coisas que teria feito fora da Presidência e 2) não há sinais de que o desfecho no TSE será rápido.

Se o presidente em pessoa está razoavelmente blindado, sua equipe não. Mas mesmo aqui cautela é recomendável. Há o fechamento do acordo de delação. Depois ela precisa ser homologada. Depois autorizar-se-ão as investigações, na primeira instância e nas superiores. Depois virão as denúncias. Depois as aceitações. E depois os julgamentos.

É um processo. E não parece estar nos planos de Temer ver o governo transformado numa coleção de pinos de boliche, à espera de serem derrubados por notícias. E parecem ganhar alguma tração, conforme diversos registros na imprensa neste fim de semana, as iniciativas para distinguir o crime de caixa 2 eleitoral dos de corrupção e lavagem.

É arriscado apostar nos cenários extremos de 1) nada vai acontecer aos políticos delatados pois são muitos ou 2) todos os políticos delatados vão estar marcados para morrer à simples citação de seu nome. É provável um quadro intermediário, que ainda não se apresenta com nitidez. Daí a necessidade da prudência na análise.

O segundo vetor de risco é o congressual. Temer não é popular, e não há no horizonte uma mágica econômica que possa inverter instantaneamente o sentido do vento. No cenário otimista, terminará o governo com a economia razoavelmente organizada e uma avaliação mediana. Onde está a força então para a travessia? Na maioria política reunida.

O maior risco para manter a maioria são dois. 1) A momentânea extrema fraqueza da oposição estimula o acendimento precoce dos apetites internos voltados para 2018. Isso impacta, também, a naturalmente 2) complexa operação de fazer a sucessão nas Presidências do Congresso sem rachar a preciosa base de apoio do governo.

Ainda mais num cenário de fortes restrições orçamentárias e limitações óbvias à capacidade de lotear fatias atraentes do Orçamento e das estatais aos partidos e grupos. A equipe política estará chamada a dizer a que veio. Se a base rachar, mas o governo ganhar, haverá instabilidade. Se perder, abrir-se-ão as portas para o imponderável.

Até porque o próximo presidente da Câmara terá expectativa de poder, sendo na prática o vice-presidente em exercício. Ter um inimigo da estabilidade nesse posto seria no mínimo preocupante para um governo pouco popular e de origem contestada. Poderia ser fatal. E ainda há o desafio de eleger um presidente do Senado não completamente vulnerável.

*

O STF inclina-se a proibir réus na linha de sucessão da Presidência da República. Seria lógico então proibir réus de concorrer a presidente da República. Mas qualquer juiz de primeira instância pode aceitar uma denúncia contra quem não tem prerrogativa de foro. E estenda-se para a eleição de governador e prefeito e as respectivas linhas de sucessão.

Mas a Ficha Limpa diz que primeira instância não torna ninguém inelegível.

Como dizia o Conselheiro Acácio, as consequências costumam vir depois.

Prestar atenção:



  • A Lava-Jato

  • A proposta de criminalizar doações de campanha não declaradas

  • O Senado e o teto de gastos

  • O ajuste fiscal no Rio de Janeiro