Dilma Rousseff teve uma janela de ano e meio para evitar o isolamento que a ameaça com o cadafalso. Os obstáculos à “governabilidade” já estavam delineados depois da eleição. Menos pela vitória estreita e mais pelo contraste brutal entre o cenário descrito na campanha e a realidade pós-urna.
A mesma estratégia que trouxe a vitória eleitoral plantou a semente da derrota política, talvez por um erro de cálculo. Talvez a presidente e seu círculo mais próximo supusessem que a estratégia de Sarney/1986 e Fernando Henrique/1998 bastaria: uma conversa bonita na eleição e depois agarrar-se à institucionalidade para atravessar os anos de vacas magras.
Acontece que Sarney e Fernando Henrique nunca caíram na ausência de poder. Sempre mantiveram, mesmo nos piores momentos, comando sobre o Estado, maioria parlamentar, forte apoio da imprensa para concluir o mandato e espaço de ação no Judiciário. Dilma II não manda na polícia, no Congresso, no Banco Central, não pode aumentar impostos nem nomear ministros, e assiste à caçada midiático-policial-judicial contra ela e os aliados.
Num trade-off, o establishment decidiu aproveitar a presidente fraca para remover o PT do governo, mesmo arriscando turbulência política e social, e não apoiar um governo petista que se mostrou permeável a aplicar medidas pedidas pelo establishment. E o economicismo sai de cena, de mãos dadas com o legalismo. A preliminar é tirar a presidente. As formalidades vêm depois. Isso dá a Dilma e ao PT a narrativa da defesa da legalidade. Boa para construir o amanhã, mas insuficiente para resistir hoje.
A margem de manobra estreitou-se demais também porque Dilma pouco ou nada tem a oferecer aos aliados e aos adversários que eles próprios não possam obter sem ela. O PMDB esperou, até trazer o apoio do PSDB e receber o sinal verde da opinião pública, tradicionalmente crítica ao PMDB. Agora, com a Presidência ao alcance, não tem por que persistir na subalternidade. Restam os bolsões peemedebistas resistentes à hegemonia do grupo de Michel Temer, mas não parece suficiente para brecar o trem que vai rumo à estação do poder.
Dilma levitou durante mais de um ano graças à falta de consenso mínimo para a alternativa. Mas não teve força para resistir à blitzkrieg deste março, mês para agosto nenhum botar defeito. Mais do que os fatos em si, a sequência deles fez os políticos concluírem que a paralisia do núcleo se tornara uma ameaça ao conjunto do sistema. E parecem cada vez mais preferir o risco do colapso à certeza de que o colapso virá.
O que poderia, a esta altura, frear a composição peemedebista-oposicionista? Só um descarrilamento. O governo pode até vencer a primeira votação de impeachment, que provavelmente será sucedida por um novo pedido de impedimento. Já há alguns na fila. Só o que pode mudar a partida por um tempo é algum imprevisto com o vice. Pois mesmo com o jogo jogado não parece haver massa crítica para sustentar o presidente da Câmara no Planalto, ainda que interino.
E tem a Lava-Jato. Se o andamento da operação é, felizmente, incontrolável, seus efeitos imediatos sobre a política dependem não apenas das investigações em si, mas de como a política consegue montar um dique para conter os efeitos políticos das revelações.
Isso é possível? Um exemplo é o presidente da Câmara, cujas atribulações não são suficientes para deslegitimá-lo diante da opinião pública que trabalha para derrubar Dilma. E aí concluiremos que o que aparece como luta contra a corrupção embute a luta violenta pelo poder.
Porcentagens, considerando que o PMDB romperá com o governo: Impeachment 55%, TSE 25%. Dilma fica, sem poder 20%.
Prestar atenção: