segunda-feira, 25 de abril de 2016

Desafio de Temer é evitar que polêmica econômica desmonte a base parlamentar

• Medidas emergenciais de austeridade terão apoio no Congresso?
• Políticos não querem eleições já, mas não têm controle completo
• Futuro do novo governo depende do que projetar para o... futuro

A história também se constrói sobre ironias. No crepúsculo, a administração Dilma Rousseff oferece ao presidente ainda virtual Michel Temer a base parlamentar que lhe faltou para governar e evitar o afastamento do cargo. As votações na Câmara e na comissão do Senado são o rito de passagem.

Dilma havia algum tempo não reunia apoio político majoritário para comandar o país. Concentrava-se em garantir respaldo minoritário suficiente para evitar a deposição. Não conseguiu, por 25 votos na Câmara. Agora é Temer que vê o enigma: como transformar o fácil antidilmismo em pró-temerismo?

O problema do ainda vice é prático. Dilma caminha rumo à queda por: 1) não montar e uma base parlamentar majoritária e operacional e 2) não oferecer um caminho visível para a recuperação econômica. Ou Temer tem sucesso imediato nos dois aspectos ou verá crescer rapidamente as ameaças. O TSE está aí para qualquer eventualidade.

O problema é que a revelação dos roteiros para o segundo ponto embaralha o primeiro. O Brasil está há décadas politicamente organizado em torno da fantasia fácil do “dinheiro tem, é só empregá-lo adequadamente”.

Bastaria “melhorar a gestão” e combater a corrupção. Agora, um presidente transitório e de legitimidade contestada vai dizer que o dinheiro acabou, e tem de fazer isso sem dinamitar o apoio parlamentar.

Temer leva sobre Dilma a vantagem do apoio empresarial e da imprensa, além de nenhuma força política ponderável querer eleições já.

Mas, como se viu agora na debacle do PT, não há articulação política que resista se enfrentar por tempo suficiente uma pressão social decisiva. Pelo menos na democracia, isso acaba refletindo no Parlamento. E na Justiça.

No momento, a oposição a Temer está acuada, e o radicalismo verbal é um sintoma do isolamento.

Mas é também verdade que o PT sai razoavelmente coeso e reaproxima-se da esquerda. E deve emergir da derrota com uma “narrativa” (para usar a expressão da moda) íntegra: de que foi “derrubado por um golpe tramado pela elite, que novamente quer impor ao povo sacrifícios para debelar uma crise que ela mesmo produziu”.

Importa menos saber se isso é verdade, ou até que ponto. Isso pode ser tão verdade quanto dizer que o PT “institucionalizou a corrupção sistêmica para perpetuar um projeto de poder” ou que “a nova matriz econômica, ao implodir o equilíbrio fiscal, provocou a atual recessão”.

A luta política não se dá em torno de verdades, mas de verossimilhanças. O que interessa é o apoio popular, social e parlamentar que cada discurso tem, e isso é diretamente proporcional ao que projeta para adiante. Dilma não está caindo principalmente pelo que fez no passado, mas pela incapacidade de mostrar que com ela o amanhã será melhor que o hoje.

Probabilidades: Abertura de processo contra Dilma no Senado e afastamento da presidente 95%, condenação definitiva de Dilma no Senado 70%, cassação da chapa Dilma-Temer pelo TSE 20%.

Prestar atenção:

• O PT conseguirá retardar o andamento do processo no Senado?
• As articulações finais para o ministério de Temer
• Fatos perturbadores vindos da Lava-Jato

segunda-feira, 18 de abril de 2016

Curto prazo é favorável ao novo governo, que depende da economia e da Lava-Jato

• Temer terá maioria parlamentar e simpatia da imprensa
• Futura oposição vê ambiente inicial de isolamento
• Cansaço com a crise favorecerá apelos pela improvável “paz”

O desafio do bloco de poder constituído em torno de PMDB e PSDB para derrubar o governo Dilma Rousseff e tirar o PT do Palácio do Planalto é estabilizar-se para: 1) acelerar e consolidar a condenação final da presidente no Senado Federal, permitindo a instalação definitiva do governo Michel Temer e 2) evitar a cassação no TSE.

Como viu-se agora, a realidade política subordina a tecnicalidade jurídica. Especialmente quando as leis tratam da solução de disputas de poder.

Quando os governos se isolam na cúpula e na base da sociedade, o sistema encontra algum caminho para resolver a crise “juridicamente”.

Há juristas para todos os gostos e serviços, e essa acaba sendo a parte menos complexa da empreitada. Resolvido o nó político, encontra-se facilmente na prateleira algum mecanismo formalmente legitimador.

Quando o governo Temer finalmente existir de direito, ele terá uma base parlamentar confortável. É improvável que venha a sofrer impeachment. Eleições antecipadas não interessam hoje a nenhum grupo político relevante. E a partir de 2017 a eleição seria indireta.

Restarão dois obstáculos.

O primeiro será apontar caminhos de recuperação econômica convincente, que precisarão estar apoiados em duas pernas: 1) um reequilíbrio fiscal crível, para criar horizontes visíveis na economia e 2) uma perspectiva de forte lucratividade para os investimentos, pois empresários investem com o objetivo de lucrar.

O segundo será circunscrever os efeitos políticos da Lava-Jato. Se é verdade que o mundo da política pouco pode interferir diretamente na operação, é verdade também que a amplificação jornalística das investigações flutua de acordo com desejos e alinhamentos político-empresariais.

E mesmo se Eduardo Cunha tiver de deixar a Presidência da Câmara (o que não é certo), a aliança Temer-Cunha tem força para fazer o sucessor.

Caso o governo Temer tenha razoável sucesso inicial nas duas frentes, economia e Lava-Jato, é também razoável prever que o Senado confirmará o fim do mandato de Dilma e que o TSE dificilmente contrariará a dinâmica de acomodação política.

E a nova oposição? O momento inicial será de radicalização e resistência social. Mas os recém-derrotados se defrontarão com o isolamento político e midiático, que certamente refletirá nos ralos espaços disponíveis na imprensa para propagar o inconformismo.

O eventual novo governo também se beneficiará do foco crescente nas eleições municipais, para onde tende a se deslocar o front, em busca do combustível para 2018. E aproveitará o cansaço da sociedade com a prolongada luta política, fadiga que servirá de pretexto para uma onda de apelos à conciliação vinda de quem até agora pedia guerra.

Os problemas, como lembraria o Conselheiro Acácio, aparecerão depois. Provavelmente causados pela baixa capacidade de entregar o esperado.

Probabilidades: Abertura de processo contra Dilma no Senado 80%, condenação definitiva de Dilma 60%, cassação da chapa pelo TSE 20%.

Prestar atenção:

• O ritmo do processo contra Dilma no Senado
• Novas ações da Lava-Jato contra Lula e Eduardo Cunha
• O ministério de Temer, especialmente na economia

segunda-feira, 11 de abril de 2016

Ambos os lados temem a derrota, pois ainda não enfraqueceram decisivamente o outro

  • Narrativas do governo e da oposição aglutinaram seus campos
  • PMDB de Temer aproxima-se, pelo vácuo, do poder
  • Partido tenta chegar ao Planalto sem precisar dizer o que vai fazer ali
    Os campos que disputam o poder federal chegam à semana da decisão com risco real de derrota. Nenhum conseguiu impor ao adversário um enfraquecimento decisivo nestes meses de guerra política aberta.

    Nenhum lado conseguiu romper o empate catastrófico. É a terminologia que usamos ao longo desta crise para definir o equilíbrio estratégico de forças. Que se expressa também na capacidade de as narrativas atraírem seus públicos potenciais. Entretanto, se um não consegue falar ao outro, para ao menos colocar uma cunha no lado de lá, persiste o empate.

    A oposição não conseguiu impedir que o PT/governo reaglutinasse o campo politico autodefinido como progressista para a resistência contra o “golpe branco supostamente constitucional”. Melhor sintoma: apesar de o governo Dilma patinar em torno de 10% de ótimo+bom, quase 40% da população não aderiu a proposta de retirá-lo do poder antes da hora.

    E o governo não conseguiu impedir a oposição de convencer cerca de 60% da sociedade e do Congresso de que tirar Dilma/PT já é vital para começar a resolver os graves problemas nacionais. Especialmente a recessão econômica e a “corrupção sistêmica”.

    A oposição não conseguiu reduzir o PT/governo a “organização criminosa que tomou o Estado brasileiro e levou a corrupção a níveis sistêmicos para perpetuar seu projeto de poder”. E o governo/PT não conseguiu reduzir os oponentes a “elite insensível e privilegiada que não se conforma com a derrota eleitoral e a ascensão social dos pobres, pretos e favelados”.

    A crer nas pesquisas, o impeachment tem o apoio de quem votou PSDB no segundo turno da eleição de 2014, e da maioria dos que não votaram em ninguém. Mas enfrenta oposição absoluta de quem votou PT.

    E os discursos apenas negativos e destrutivos não produziram uma narrativa "propositiva" para sustentar a opção que está à mão. O PMDB temerista aproxima-se do poder por inércia. Trazido pelo vácuo. Quando o PMDB terá uma oportunidade como esta, de tomar o Planalto sem nem precisar dizer o que vai fazer lá? Provavelmente nunca mais. Não surpreende que estejam empenhados na missão.

    E o dia seguinte?

    Se Dilma passar esta barreira é possível que o presidente da Câmara aceite outro pedido de impeachment contra ela, até por um detalhe: enquanto o filme “Fora Dilma” estiver em exibição nas principais salas comerciais, o “Fora Cunha” continuará no circuito cultural alternativo.

    Já a coligação em torno de Michel Temer nasceria com duas marcas registradas da política brasileira: o desalinhamento sobre o que fazer na economia e a heterogeneidade da base de apoio no Legislativo.

    Não é realista imaginar que a bastante liberal “Ponte para o Futuro” dos formuladores peemedebistas tenha apoio na maioria dos que marcham nas ruas e no Congresso para colocar o PMDB no poder.

    O súbito liberalismo do PMDB tem sido útil para angariar apoio politico e material dos empresários que querem derrubar o governo do PT, mas dificilmente servirá para algo além disso.

    Probabilidades: Impeachment 50%, cassação pelo TSE 25%. Dilma fica, sem poder 25%

    Prestar atenção:

    • Novos fatos espetaculares, especialmente na Lava-Jato

    • Recursos do governo ao STF

    • Mobilização social, gente na rua
  • segunda-feira, 4 de abril de 2016

    Graças às contradições no PMDB, governo ainda luta. Mas o que virá na Lava-Jato?

  • Temer queima caravelas, mas com outros barcos à mão
  • Vice enfrenta desgaste e ameaças antes mesmo de assumir
  • Senhores feudais do PMDB resistem a dar poderes imperiais ao rei
  • Lula traz esperanças ao mundo político

    O senso comum diz que o grupo de Michel Temer errou ao forçar a ruptura formal do PMDB com o governo para acelerar a deposição de Dilma Roussef. Abriu espaço para a operação política palaciana. Já que a política tem horror ao vácuo, preencha-se.

    A realidade é um pouco mais complexa, como se vê desde lá: o PMDB, ávido de poder, rompeu mas não saiu. Foi um gesto político, para garantir aos generais e às tropas da derrubada do governo que o vice está nesta para valer.

    O PMDB é incremental, como todo partido em relacionamento sério com o poder. Nunca foi de gestos heróicos. Só se move em direção a mais poder. Nunca a menos. O temerismo queimou as caravelas, mas cuidou de verificar se havia outros barcos à mão.

    O cenário para o vice não é simples. Diferente de Itamar Franco no impeachment de Fernando Collor, ele enfrenta desgaste e ameaças a um mandato que ainda não assumiu. Se for impulsivo, pode reunir menos força que a necessária para vencer a batalha. Se for cauteloso, pode ver crescer o movimento para despachá-lo ao ostracismo junto com Dilma.

    A fragilidade política-jurídica-eleitoral do vice, e do grupo que o cerca e sustenta, é um vetor fundamental para entender por que Dilma tem sobrevivido, mesmo em extrema debilidade política e social. Sem suporte decisivo, Dilma levita há tempos graças à não convergência em torno das alternativas.

    O xeque-mate em Dilma e no PT sempre dependeu de PMDB e PSDB estarem cada um majoritariamente coesos e ambos unidos pela deposição. Não necessariamente 100%, mas bem perto disso.

    Um dos trunfos da presidente, as divisões intratucanas, parece ter-se ido. Há acordo hoje no PSDB sobre a inconveniência de eleições já -pelas circunstâncias de cada um dos postulantes- e sobre a conveniência de um governo Temer.

    Persiste a divisão sobre se é bom ou ruim um governo Temer dar certo. Os tucanos enxergam nele um Kerensky. Só divergem sobre se o sonhado pós-Temer deve nascer do útero do temerismo, com suas bênçãos, ou enfraquecendo-o. Mas fevereiro vem antes de outubro.

    Outra variável que parecia resolvida dá sinais de não estar. Uma parte dos senhores feudais peemedebistas, e de outros partidos, resistem a coroar um rei que poderia buscar poderes imperiais e querer subjugá-los, aproveitando-se do cerco da Lava-Jato contra a enrolada nobreza e surfando na ansiedade da opinião pública por uma nova ordem.

    Os políticos querem uma solução que os proteja, e a corrosão de Dilma deveu-se também à estratégia dela de salvar-se às custas do sacrifício, se necessário, de todo o sistema. Mas a entrada de Luiz Inácio Lula da Silva em campo, se se consolidar, dará sinais de que o jogo mudou.

    E assim caminhamos para a hora decisiva, quando cada um mostrará as garrafas que tem para entregar. A variável fora de controle? Lava-Jato. A blitzkrieg vem sendo decisiva para inverter a correlação de forças. Quais serão as novidades policiais-judiciais daqui até a votação do impeachment?

    Porcentagens: Impeachment 50%, cassação pelo TSE 25%, Dilma fica sem poder 25%.

    Atenção:

    • A decisão do STF sobre Lula na Casa Civil

    • O governo conseguirá arrancar o temerismo dos cargos?

    • Lava-Jato, delações premiadas e vazamentos