Alon Feuerwerker
jornalista e analista político
bio -> https://pt.wikipedia.org/wiki/alon_feuerwerker
sexta-feira, 30 de abril de 2021
O "argumento Anvisa"
quinta-feira, 29 de abril de 2021
Terreno de combate
Governos que perdem a maioria em casas do Congresso
passam a ser alvo de uma "caça à raposa". E a situação fica pior
quando sofrem a ofensiva coordenada entre a oposição e os mecanismos de
formação da opinião pública. Parece ser o caso agora das relações entre a
administração Jair Bolsonaro e o Senado, como se está vendo nesta etapa inicial
dos trabalhos da CPI da Covid-19.
Uma interpretação é o governo ter bobeado, pois em
tese teria maioria no Senado, mas permitiu que a carruagem corresse solta até as
bancadas indicarem, para compor a CPI, gente que faz oposição. Outra
interpretação, talvez mais realista, deduz que o governo cuidou de não perder a
Câmara, onde começam os processos de impeachment, e descuidou da outra casa.
Onde, na real, já estaria hoje em minoria.
Que siga o debate, mas agora o teatro está instalado e a CPI opera numa correlação de forças extremamente desfavorável a Bolsonaro. Bem num momento em que a média móvel de casos e mortes começa a descer a ladeira (continuará?), a vacinação anda e os números que saem todo dia da economia não são tão ruins quanto eram as previsões. Inclusive porque EUA e China aceleram.
E isso em algum grau nos puxa. Mesmo que não seja muito, já é um refresco.
Um efeito político já contratado na CPI é garantir que se prolongue no tempo o abastecimento de noticiário negativo, sempre um problema para o candidato à reeleição. Mas esse será um transtorno administrável se o governismo se mantiver protegido na Câmara, que tem o botão capaz de implodir a edificação.
E talvez não seja de todo ruim para o oficialismo que o relator da CPI e o presidente da Câmara sejam do mesmo estado e ferozes adversários. Pois toda política é em boa medida local.
Mas, em última instância, é sempre o próprio governo que precisa lutar. E CPIs são mesmo terrenos de combate. E em CPIs de poucos membros, qualquer voto pode virar o placar.
quarta-feira, 28 de abril de 2021
Retrocesso educacional
terça-feira, 27 de abril de 2021
A largada da CPI
segunda-feira, 26 de abril de 2021
Índia
sábado, 24 de abril de 2021
A caça à raposa. E o contra-ataque das “instituições que estão funcionando”
O governo Jair Bolsonaro e o próprio presidente entraram num
período de defensiva, pois os tropeços na condução da epidemia da
Covid-19 acabaram dando aos adversários a oportunidade de retomar a iniciativa.
E o ambiente tornou-se mais favorável ao desarranjo político quando a segunda
onda de casos e mortes pelo SARS-CoV-2, turbinada pela cepa de Manaus, antecipou-se violentamente ao cronograma
da vacinação e criou um caldo de cultura propício para o contra-ataque dos
aparelhos alvo do bonapartismo presidencial.
Já foi descrito nas análises dos últimos quase três anos: o
colapso operacional e de imagem da Nova República, catalisado na última etapa pela
Operação Lava-Jato, acabou transformando o bonapartismo (um governo concentrado
no líder, que exerce o poder em conexão direta com as massas) em objeto de
desejo. O problema? Não há um único candidato a Bonaparte, o sobrinho e não o
tio: concorrem o presidente da República, os próceres do Judiciário e do
Congresso, além de outros menos apetrechados, mas nem por isso menos
ambiciosos.
A eleição de Jair Bolsonaro foi, na essência, a outorga de
um mandato bonapartista, algo exigido por décadas no processo de formação da opinião
pública entre nós. E o presidente até que tentou. Desprezou os partidos na
montagem da Esplanada e saiu a aplicar, por decretos e medidas provisórias, o
programa vitorioso nas urnas. E vinha naturalmente produzindo conflitos,
especialmente com os núcleos empoderados pelo lavajatismo, que provocou um dos
maiores efeitos centrífugos no poder político em toda a história nacional.
Aí vieram a pandemia, a dispersão operacional do combate a ela,
a captura do debate científico e sanitário pela guerra de facções, os números
trágicos de casos e, principalmente, mortes. E a polarização política nesse
ambiente acabou por estimular na sociedade a convergência do antibolsonarismo,
hoje algo majoritário. Se vai sedimentar, se vai sobreviver até a eleição, se vai
ser fragmentado, aí é outra história. Mas a situação do momento é esta. E é tal
ambiente que facilita o contra-ataque dos demais candidatos a Bonaparte.
Contra-ataque que na versão poliânica do analismo político costuma
ser descrito como “as instituições estão funcionando”. Até demais, diria-se. O
Legislativo tenta tomar para ele praticamente toda a execução orçamentária
disponível. E o Judiciário ensaia concentrar em si os poderes do Executivo e do
Legislativo. E os aos quais isso convém, no momento, por fazerem oposição, aplaudem.
Amanhã, quando chegarem ao Planalto, serão eles as vítimas. Mas cada hora com
seu problema, cada dia com sua agonia específica.
Antes da criação da CPI da Covid, o desafio do governo era
atravessar uns dois ou três meses de borrasca sanitária e econômica, à espera
de a segunda onda mergulhar e a economia tirar a cabeça da água para respirar.
O quadro agora é outro, o ecossistema propício à instabilidade vai estender-se
no tempo, alimentado pelo habitual espetáculo da CPI. Veremos como se dá a caça
à raposa, se ela consegue ou não escapar. E isso vai depender não só dos fatos
concretos trazidos à CPI, mas também terão grande peso os números da epidemia e
da economia.
sexta-feira, 23 de abril de 2021
Descendente?
O cachorro do Pavlov
Na culinária e na política, nem sempre quem faz o bolo come o bolo. Em 1992, o PT ofereceu a base popular para depor o presidente Fernando Collor de Mello. Certa hora, achou-se que Luiz Inácio Lula da Silva emergiria do processo imbatível em 1994. Mas Fernando Henrique Cardoso reagrupou as tropas dispersas do collorismo, pegou o trem do Plano Real e matou o sonho do PT de surfar a onda do impeachment rumo ao poder.
Deu-se o mesmo na queda de Dilma Rousseff. PSDB e PMDB (hoje MDB) decretaram o fim do quarto governo petista, reuniram-se em torno de Michel Temer e projetaram poder adiante no tempo. Mas a entropia trazida pela Lava Jato foi além da conta e acabaram ambos tragados pelo tornado bolsonarista. O antipetismo trouxe junto a antipolítica e o antitudo, e tucanos e peemedebistas viram o bolo escapar na undécima hora.
Esse fenômeno não se dá só em situações contaminadas por derrubadas de governos. Acontece também em transições normais, decorrentes de eleições convencionais. Quantas vezes se viu a polarização eleitoral, antes resiliente, ser atropelada por um azarão de última hora? Aí o oposicionista que fez de tudo e consumiu as melhores energias para minar o incumbente fica na poeira. Pois se tem algo difícil de combinar antecipadamente com o eleitor é o resultado de uma eleição.
Assiste-se agora à ofensiva da esquerda e da ex-direita, rebranded como centro, contra Jair Bolsonaro. No momento, o objetivo de ambas é enfraquecê-lo para derrotá-lo na urna. Até porque Hamilton Mourão não tem sido, por enquanto, um replay de Itamar Franco ou Michel Temer. Não dá esperanças aos políticos hoje excluídos do poder. Nem estes andam dispostos a cozinhar o bolo e, de novo, ficar a ver navios. E Bolsonaro vai navegando...
Mas os mares andam cada vez mais turbulentos. Inclusive por certos incômodos que a condução governamental desencadeou e fez crescer na pandemia. Um deles, importante: pela primeira vez, a elite sente algo parecido com as gentes do povão quando ficam doentes e não têm certeza de que vão encontrar um leito vazio de hospital ou UTI.
Atenção, eu disse “algo parecido”. Mesmo hoje, continuam situações no limite incomparáveis.
Na tempestade da pandemia, esquerda e centro ensaiam juntar-se para fazer o bolo da lipoaspiração do atual presidente. Mas sempre com um olho no peixe, Bolsonaro, e outro no gato, o aliado de momento e já garantido adversário de amanhã. E, ao contrário de situações históricas anteriores, desta vez nem tentam disfarçar. Não é mais um jogo de dois, bolsonarismo e antibolsonarismo, ou petismo e antipetismo, mas de três.
Jogo de três é sempre mais complicado de operar. Se até o cachorro do Pavlov aprendeu, desenvolveu reflexos condicionados, não é difícil supor que os políticos também tenham aprendido. De viver, estudar ou ouvir falar, tanto faz. Entrar de gaiato numa “frente ampla” para confeitar o bolo e correr o risco de ficar sem nenhum pedacinho dele na hora de comer talvez não atraia mais tantos incautos como no passado.
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Publicado na revista Veja de 28 de abril de 2021, edição nº 2.735
quinta-feira, 22 de abril de 2021
Desafio ambiental
A participação do Brasil no evento convocado pelos Estados Unidos para debater o meio ambiente expôs algumas fragilidades da situação brasileira. Elas têm raízes estruturais, fixadas na tensão entre desenvolvimentismo, sempre um vetor em países como o nosso, e ambientalismo, uma pauta global cada vez mais importante. Porém as raízes também residem no cerco a que o governo se permitiu submeter, numa consequência tardia do alinhamento à administração Donald Trump.
Ao longo dos últimos trinta anos, o Brasil vinha conseguindo um equilíbrio cuidadoso, mas sempre com algum grau de conflito, entre as pressões internas para aumentar a produção agrícola e as externas (e em algum grau internas) para congelar a fronteira agrícola e manter essencialmente intocado o bioma amazônico. Com o alinhamento a Trump, conhecido cético do clima, o Brasil imaginou-se de mãos livres para reduzir o risco de uma política mais desenvolvimentista (no campo) que ambientalista.
Mas Trump perdeu a eleição para Joe Biden, e além do mais o Brasil meio que se intrometeu na confusão pós-eleitoral dali, e do lado perdedor. O que, com o tempo, vem criando as condições ideais para uma aproximação entre as várias oposições brasileiras e o novo establishment político norte-americano. E agora a administração Bolsonaro precisa operar uma espécio de retirada sob cerco e fogo inimigos, sempre uma manobra que exige grande perícia e, por que não?, sorte.
O grande empresariado brasileiro quer do governo que a política ambiental não atrapalhe os negócios com os Estados Unidos e a Europa, num momento em que o real fraco é o passaporte da prosperidade para o setor exportador da economia. Mas Jair Bolsonaro precisará equilibrar-se entre isso e os afagos à base eleitoral dele, nutrida no discurso anterior. Não é impossível, mas vai exigir perícia e boa condução. Um desafio operacional.
Desperdício
quarta-feira, 21 de abril de 2021
Articulação empresarial
O governo Jair Bolsonaro encara desafios imediatos em três frentes. Precisa equacionar suas relações com a nova administração norte-americana, neutralizar - ou tentar - o desgaste na Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado sobre a pandemia e evitar a corrosão do apoio na elite empresarial, de olho em 2022. Neste último ponto, enfrenta as alternativas da volta de Luiz Inácio Lula da Silva e da busca de uma alternativa a ambos.
A aproximação do presidente com os empresários esta semana
foi tática, para buscar apoio na dura negociação com Joe Biden sobre o clima,
mas também estratégica, de olho nos movimentos de Lula e do assim chamado
centro, que busca romper a inércia e a debilidade eleitoral de seus possíveis nomes,
como apontado nas pesquisas. Até o momento, nenhum deles ultrapassa a barreira
entre um e dois dígitos, quando confrontado com os dois líderes.
O governo resolveu esta semana a encrenca do orçamento para
2021, mesmo que à custa de furar o teto de gastos nas despesas não recorrentes.
Mas a solução foi aceitável para o ministro da Economia, encerrando mais um
miniciclo de rumores sobre a saída dele do governo. A variável a acompanhar
agora é o desempenho da economia. E da inflação. Esta última deve ser uma fonte
de notícias negativas nos próximos meses.
terça-feira, 20 de abril de 2021
Cone Sul
segunda-feira, 19 de abril de 2021
Por que não mais horas, em vez de menos?
Um problema adicional de viver, e governar, numa pandemia em ambiente politicamente contaminado pela luta sem princípios entre facções é a dificuldade de encontrar espaço para debater os assuntos com alguma racionalidade.
Um caso bastente concreto são as restrições à abertura do comércio. A rotina tem sido autorizar o comércio a reabrir, mas em horários mais limitados. Na teoria, isso deveria reduzir o acúmulo de pessoas e portanto as aglomerações, inclusive no transporte.
Na prática, parece estar acontecendo o contrário (leia). E uma hipótese razoável para isso é matemática. Dada uma certa população e uma certa oferta de serviços comerciais, quando menos horas houver de comércio aberto, mais gente buscará os estabelecimentos ao mesmo tempo.
E mais gente precisará acessar o transporte coletivo ao mesmo tempo.
Não seria melhor estender, em vez de restringir, o horário de funcionamento de lojas, mercados e supermercados? O que também eventualmente poderia ajudar a expandir a oferta de empregos no setor.
sábado, 17 de abril de 2021
Chegou a CPI. E aqui é Brasil
Vem sendo observado, e escrito, desde as eleições de 2018: o
então candidato do PSL e hoje presidente da República enfrenta dois
agrupamentos, a esquerda e a autointitulada centro-direita. Como ensina a
história, guerrear em duas frentes é complicado. Ainda mais se alguma hora os
adversários resolvem juntar-se, entendem-se sobre o dia seguinte a uma eventual
saída do governante.
A esquerda é liderada pelo PT, mesmo que os liderados dele
busquem o tempo todo desvencilhar-se do líder. A oposição à direita é a que
construiu o impeachment de Dilma Rousseff, foi o esqueleto e a musculatura do
governo Michel Temer e imaginava consolidar-se no poder em 2018. Mas acabou ultrapassada, de passagem, por Bolsonaro ainda no primeiro turno.
E ficou sem opção a não ser sustentá-lo no segundo. E hoje
apoia o programa econômico dele mas faz oposição a ele. O Brasil, como se sabe,
não é mesmo para amadores.
A esquerda traz no momento o risco eleitoral concreto para o presidente. Não que a direita alternativa ao bolsonarismo deixe de representar perigo nesse terreno. O problema dela são as relativamente menores, por enquanto, chances de passar ao segundo turno. E com Luiz Inácio Lula da Silva elegível o desafio tornou-se ainda mais complicado. É improvável que esse autonomeado “centro” penetre na base lulista.
Sobra então tentar tirar Bolsonaro. Na eleição ou se possível antes. O problema da segunda hipótese: e se o hoje vice senta na cadeira e ganha musculatura para 2022?
Nenhum presidente brasileiro perdeu a reeleição desde que o
instituto foi aprovado, na sucessão de 1998. Ou seja, nenhum ficou fora do
segundo turno quando não venceu no primeiro. Daí o grau de dificuldade que o
teatro de operações eleitoral coloca na caminhada do centrismo. A primeira
escalada da parede é tentar convergir em torno de um candidato competitivo. A
segunda é dar um jeito de fazer Bolsonaro baixar decisivamente de seus 25% a
30% de apoio e intenção de voto.
A Comissão Parlamentar de Inquérito sobre as ações federais
na pandemia é, antes de tudo, instrumento para avançar nessa missão.
Inviabilizar Bolsonaro eleitoralmente. Em 2005, imaginava-se que a CPI dos
Correios pudesse fazer isso com Lula. Não funcionou então. Funcionará agora? Na
comparação, o quadro é muito mais complicado hoje para o governo. São centenas
de milhares de mortos pela Covid-19 para lançar na contabilidade política.
E o petista tinha uma base congressual mais consolidada. Em
comum com Bolsonaro agora, enfrentava uma barragem unânime de imprensa.
Como Lula ultrapassou a cancela naqueles anos? Em primeiro
lugar, as assim chamadas “investigações” da CPI não chegaram nele. Os motivos ficam para análise dos historiadores. Mas não chegaram. E na passagem de
2005 para 2006 a economia acelerou, tanto que o crescimento do PIB no último ano
do primeiro mandato lulista bateu em 4,0%. Na época, foi recebido como algo
bom. Hoje, um número assim seria saudado com espoucar de rolhas.
O presidente atual enfrenta uma conjuntura bem mais
complexa. Os números da economia para o resto do ano ainda são uma incógnita,
mas é razoável supor que no início do próximo estarão melhor. Pelo menos é a
aposta empresarial. Resta esperar para ver se a CPI conseguirá, na visão do
grande público, cravar na figura presidencial a responsabilidade pelas mortes
na pandemia. Hoje, as pesquisas apontam uma culpa ainda algo distribuída.
E será que mesmo isso conseguiria lipoaspirar a base
bolsonarista raiz?
E tem um detalhe final. É sempre bom deixar a porta aberta,
na análise, para alguma heterodoxia jurídico-política. Aqui é Brasil.
sexta-feira, 16 de abril de 2021
Big data
quinta-feira, 15 de abril de 2021
Segunda dose
quarta-feira, 14 de abril de 2021
A CPI
terça-feira, 13 de abril de 2021
Mais estudos
segunda-feira, 12 de abril de 2021
Eficácia
sexta-feira, 9 de abril de 2021
Flexibilização
Bolsonaro enfrenta a maldição do terceiro ano
A política no mudo
Apesar de tudo, o universo da política continua achando mais provável Jair Bolsonaro ficar no Planalto pelo menos até 2022. E tem outra. Depois de Luiz Inácio Lula da Silva voltar à elegibilidade, diminuiu naturalmente o número de quem vê o atual presidente na cadeira até 2026. Diminuiu, mas está longe de ter virado fumaça.
O ambiente anda chacoalhado. Esqueça porém os discursos: os principais atores só estão de olho mesmo é em 2022. Isso seria
apenas o óbvio, não comparecessem dia sim outro também
diante do público para dizer que estamos mergulhados numa tragédia (e
estamos mesmo), e que isso exige medidas radicais imediatas.
De vez em quando, faça como numa dessas reuniões no Zoom, ou no Teams: coloque a política no mudo. Preste atenção
no que os políticos fazem, e não no que dizem. Um exemplo foi o manifesto dos
seis pré-presidenciáveis. Na forma, um libelo pela democracia. Na alma,
apenas um posicionamento para a eleição. Contra Bolsonaro, Lula e possíveis
aliados de cada um dos dois.
Se a prioridade fosse fazer um gesto antibolsonarista, Lula teria sido
convidado. Mas suponhamos que as atribulações jurídicas dele constrangeram os
autores. Então por que não chamaram o Guilherme Boulos? Ele é pré-candidato. Ou
seja, se tirarmos o som, conclui-se que no manifesto a dita fé democrática
apenas encobriu mais uma tentativa de alavancagem eleitoral “contra os extremos”.
Teria sido melhor dizer “olha, somos pré-candidatos, mas
estamos dispostos a juntar-nos em torno de um único nome”. Esta é, aliás,
uma vantagem do atual ocupante do Planalto: as falas dele trazem o que pretendem dizer, não encobrem intenções e não exigem do povo grande esforço de
interpretação.
Querem saber uma razão da estabilidade vivida
pelo governo Bolsonaro, mesmo com a tragédia sanitária e suas consequências
econômicas? Não há consenso entre os adversários de que qualquer coisa é preferível a ele na presidência.
E o capitão vai tocando o barco, protegendo e mantendo organizadas suas fileiras,
para resistir e preservar uma musculatura político-eleitoral que o coloque pelo
menos no segundo turno em 2022.
Não que a vida do presidente esteja resolvida. Vamos ver o
que sai da caixinha de surpresas do Supremo Tribunal Federal dia 14, mas se
Lula continuar candidatável espera-se a intensificação do
bombardeio contra Bolsonaro vindo do “centro”, para tentar demoli-lo e
oferecer-se ao eleitorado hoje bolsonarista como única opção contra “a ameaça
da volta do PT”.
Sobre isso, espera-se também um esforço monumental do establishment para convergir o "centro" num único nome.
A política brasileira é cheia de sobressaltos, mas também
tediosamente previsível.
Ah, e uma diferença definitiva entre a situação de agora e a das Diretas Já, citada no "manifesto dos seis". Em 1984/85, os liberais que hoje seriam chamados de centristas aceitaram juntar-se à esquerda. Não consta que alguma vez Ulysses Guimarães, Franco Montoro ou mesmo Tancredo Neves tenham colocado a coisa como uma luta “contra os extremos”.
Era outro tempo. E outro tipo de político.
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Publicado na revista Veja de 14 de abril de 2021, edição nº 2.733
quinta-feira, 8 de abril de 2021
Fabricação nacional
quarta-feira, 7 de abril de 2021
A corrida
Funcionários do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo vacinados com a CoronaVac tiveram incidência de Covid-19 de até quase 75% abaixo da população em geral (leia). O estudo foi feito e divulgado pela própria instituição. É uma excelente notícia. E ficará melhor ainda se e quando for comprovado que a vacina funciona bem contra as novas cepas.
O mundo e naturalmente o Brasil assistem a uma corrida de vida ou morte entre o contágio e a imunização. Que se dá pelo efeito conjugado da vacina e do próprio vírus. Entre nós, a vantagem da vacinação diária sobre os novos casos registrados diariamente já é de 10 para 1. Mas esse número pode enganar, por causa da subnotificação de casos, muito especialmente os assintomáticos.
Saberemos que a vida vai começar a ganhar a corrida contra a morte quando a média móvel diária de novos casos registrados entrar em declínio. A de mortes deverá demorar um tanto a mais, mas seguirá depois a mesma tendência. É o que se verifica em países onde a vacinação já alcançou porcentagens substanciais da sociedade, especialmente nos grupos mais vulneráveis.
terça-feira, 6 de abril de 2021
Que venha a Sputnik V
segunda-feira, 5 de abril de 2021
Fora da pauta
sexta-feira, 2 de abril de 2021
Ofensiva ou defensiva? E uma lembrança sobre 1964
As movimentações do poder nos últimos dias permitem pelo menos duas leituras. Uma diz que a troca dos comandantes das Forças Armadas faz parte de certo rearranjo numa ofensiva política do presidente da República. Expressão desse raciocínio é a palavra “golpe” ter dado as caras com assiduidade durante algumas horas.
Em especial no intervalo entre a demissão da antiga cúpula
militar e o anúncio da nova.
Cada um tem sua própria opinião, mas a minha é que talvez tenha sido o contrário. Talvez o movimento presidencial tenha sido essencialmente
defensivo, parte da construção de barreiras protetivas num período em que a
ofensiva é dos adversários ferrenhos, circunstância que sempre embute o risco
de provocar desequilíbrios em aliados não tão orgânicos assim.
O cenário das últimas semanas combina números trágicos e
explosivos da Covid-19, dúvidas disseminadas sobre o ritmo da vacinação,
desconforto sobre o valor do novo auxílio emergencial, temores de perda de
fôlego da atividade econômica, conflito aberto do presidente com a maioria dos
governadores em torno das medidas de isolamento social.
E até dias atrás juntava-se a isso a encrenca do então
chanceler com o Senado Federal.
Em certo momento da confusão, o presidente da Câmara, último muro que separa a oposição de entrar no terreno do impeachment, ligou o
sinal amarelo. Quem avisa, aliado é. A partir dali, ficar parado não era mais
opção para Jair Bolsonaro. Ele entrava na situação corriqueira dos presidentes brasileiros: ter de oferecer os anéis antes de perder os dedos.
Mas só recuar provocaria efeitos colaterais indesejados. Preservaria forças e
recursos do poder. Mas também transmitiria sinal de fraqueza. Que sempre tem uma resultante perigosa: acender ainda mais apetites. Na última linha, a política não
se define pelo sentimento de gratidão, define-se pela correlação de forças. Quem
quer sobreviver precisa ter força, ou ao menos dar a impressão.
É fácil constatar. Se Bolsonaro tivesse apenas trocado o
chanceler e aberto espaço no núcleo do Planalto para uma aliada do presidente
da Câmara, o noticiário giraria em torno do recuo do presidente sob pressão.
Como ele, ao mesmo tempo, deu certo sinal de “manda quem pode”, trazendo as Forças
Armadas para dançar, o jogo simbólico ficou algo equilibrado.
Sim, apenas equilibrado, porque restou claro que os novos
comandantes foram indicados em consenso com o escalão mais alto de cada força.
Assim, ao final, todo mundo mostrou um pouco de dentes: a Câmara dos Deputados,
o Senado, o Presidente da República e a turma das quatro estrelas na Marinha,
no Exército e na Aeronáutica.
E segue o jogo. E qual é esse jogo? Há a necessidade de
combater a pandemia e retomar a economia, claro, mas a bússola política está apontada mesmo é para 2022. Aliás, esse talvez seja o principal saldo semiótico
das últimas semanas. Tem projeto? Então foco. Prepara-te para outubro do ano
que vem. As outras opções são bem menos prováveis.
Pois, a rigor, ninguém relevante está, tirando a retórica,
interessado numa ruptura. Entre os vários motivos: ao contrário de Fernando
Collor e Dilma Rousseff, o vice agora não é uma ponte potencial dos políticos para
a ocupação do governo. E outro detalhe: numa ruptura digna do nome, não tem seguro que proteja 100% de ser tragado pelo tsunami.
Sobre tsunamis, esta semana registrou-se mais um aniversário de 31 de março
de 1964. Como habitual, reacendeu-se a discussão sobre o que teria acontecido
se Jango não tivesse sido derrubado. Debate que persistirá para a eternidade.
Uma coisa, porém, é certeza. Nem Juscelino Kubitschek, nem Jânio Quadros e
muito menos Carlos Lacerda eram comunistas.
Todos apoiaram a deposição de João Goulart. E quem não
souber o que aconteceu depois com eles, é só procurar no Google.