segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Eleição rompe o impasse catastrófico e abre janela (curta?) para reformas liberalizantes

Ao longo de 2015 caracterizamos a situação política como empate catastrófico, conceito gramsciano para quando nenhum bloco da polarização consegue sobrepujar o outro decisivamente. Esse cenário é rompido em algum momento pela 1) exibição decisiva de força de um lado ou pela 2) conciliação.

A crise brasileira resolveu-se nesta etapa pela primeira alternativa. Foi o que restou, pois o governo caído não conseguira desempatá-la nem pelo confronto nem pela convergência. E o impeachment resultou num quadro em que o bloco derrotado teria imensas dificuldades para justificar, à luz de sua narrativa, qualquer conciliação com o vencedor.

A exibição de força foi eleitoral. O ex-bloco hegemônico foi esmagado nas urnas, resultado principalmente de seu isolamento. Na prática, o campo petista perdeu momentaneamente a capacidade de opor-se com eficácia às reformas (ou contrarreformas, segundo o ângulo de cada um) liberais a serem impulsionadas pela nova administração.

Não é realista assegurar que a janela de oportunidade se manterá até 2018, ou que a próxima eleição presidencial vá necessariamente cristalizar a nova hegemonia. Isso traz para o temerismo a necessidade de acelerar a agenda. Com a vantagem de não ter havido na recente história brasileira momento e situação mais propícios.

No médio prazo, o presidente precisará administrar o nascimento e fortalecimento dos apetites em seu próprio bloco, mas no curto prazo os temeristas dos diversos partidos não têm alternativa a não ser marchar com o líder. Essa tendência poderá ser verificada na prática na votação da PEC que estabelece um teto para o gasto público.

Acelerar apresenta ainda outra vantagem para o governo. A sequência da Lava-Jato promete dor de cabeça considerável para políticos de todos os pontos do espectro partidário. Se o Planalto não tiver uma agenda e não der velocidade a ela, aumenta a probabilidade de ser imobilizado pela sequência de revelações e operações. Como se deu com Dilma Rousseff.

O cenário pós-eleitoral não altera nossa projeção de que as reformas seguirão um processo gradualista e minimalista. A base parlamentar apoiará o governo, mas sem colocar em risco a reprodução de seus próprios mandatos. Os projetos chegarão ao Congresso e ali serão desbastados e digeridos, para ficarem aceitáveis ao pensamento social médio.

Mas as eleições mudaram a correlação de forças, e isso aumenta a autoridade do Executivo sobre o Legislativo. Daí ser razoável projetar que, com o enfraquecimento decisivo da resistência a Temer, o desbaste e a digestão resultem em algo mais próximo do que pedem o Ministério da Fazenda e o chamado mercado.

De onde partirá a resistência principal? Menos dos partidos e dos movimentos sociais, e mais das corporações. O primeiro exemplo foram as objeções no Judiciário e no Ministério Público à PEC do Teto de Gastos. Infelizmente, não há como atacar o buraco negro das despesas de custeio sem enfrentar o corporativismo.


Entra em fase decisiva o debate sobre as "10 medidas" apoiadas pelo Ministério Público Federal. Há alguma resistência na advocacia e em círculos mais aferrados aos direitos e garantias individuais escritos na Constituição de 1988. Mas o espírito do tempo favorece o endurecimento da legislação penal.

O Brasil está convencido de que seus recursos são abundantes, apenas são desviados pela corrupção. E que mais cadeia é a solução. Há tempos o Brasil já deveria ter tomado as providências para estender aos pobres os direitos desfrutados na prática pelos não pobres. Não aconteceu, então agora a democratização se dá pelo mecanismo inverso.

Não deixa de ter lógica.

Prestar atenção:

• As grandes delações na Lava-Jato
• Votações da PEC do Teto de Gastos
• Finalização das mudanças no pré-sal

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