Até 24 de janeiro, a esquerda vinha trabalhando a disputa eleitoral com parâmetros algo normais. Lula esticaria o enredo até quase o final, daí escolheria um estepe, os nomes alternativos teriam cada um sua votação, e se juntariam todos no segundo turno. Mas o ambiente da decisão do TRF-4 fez cair a ficha: usar padrões de normalidade em épocas anormais tem custo.
A novidade na conjuntura pós-TRF-4 é que a esquerda passou a compartilhar o principal problema da direita: a dificuldade de convergir rapidamente para um nome e ganhar massa crítica antes do outro campo. Quem junta massa crítica primeiro passa a exercer força gravitacional sobre possíveis dissidências do lado inimigo. Assim se ganham, e se perdem, as eleições.
Se antes o maior risco da esquerda era Lula ser definitivamente impugnado a menos de vinte dias da urna, quando a lei já não permite substituir, agora isso se inverteu. Lula está na prática inviabilizado eleitoralmente e não se vislumbra uma solução rápida de substituição. E a tática “Eleição sem Lula é fraude” será um ruído adicional na hora de vender um possível substituto.
Se a eleição estava mais ou menos desenhada de um lado, mas algo bagunçada do outro, agora a bagunça espalhou-se. E quem vai se dar bem no novo cenário? As pesquisas vão mostrar, mas é legítimo projetar que a vantagem estará com o nome que exibir capacidade de exercer liderança política. Se um líder sai, é razoável acreditar que haverá espaço para outro.
A rigor, até 24 de janeiro havia dois líderes: Lula e Bolsonaro, e não me refiro a líderes de pesquisa. Agora, só resta por enquanto um: Bolsonaro. Não é totalmente fora de propósito especular, inclusive, que o deputado ultraconservador herde um pedaço do espólio lulista. Assim como é possível Marina recolher uma fatia. Essa deve ser a configuração provisória imediata.
Que será chacoalhada se e quando aparecer um novo líder pela esquerda, ou um líder “por transferência”, e/ou quando e se surgir um desafiante musculoso para Bolsonaro na direita. Não precisa ser imediato. Mas os dois lados tampouco têm todo o tempo do mundo. E, de novo, quem chegar antes no riacho vai beber água limpa. Para isso terá de trabalhar. E já.
A demanda pelo líder cresce à medida que se frustram as expectativas de uma recuperação econômica vistosa. Disso dependeria a força gravitacional da continuidade. E o apelo eleitoral do “gestor”. Sem isso, a mudança prevalece. E a demanda por mudança anaboliza precisamente o cacife dos líderes, gente especializada em materializar a esperança de um bom futuro.
Assim, chegamos à hora em que a competência política separará os homens, ou as mulheres, dos meninos, ou meninas. No vácuo pós-TRF-4, largará na frente quem aparecer com uma solução que acenda antes a fagulha da esperança e, ao mesmo tempo, tenha os pés no chão da governabilidade. A configuração ótima. Mas sem o ótimo haverá sempre mercado para o bom.
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Debate-se muito sobre o próximo presidente, na ilusão de que chegando ao Planalto com a força do voto ele terá músculos para “fazer o que precisa ser feito”. Só que não. Prestar atenção na composição do próximo Congresso e em como vai evoluir até lá a relação entre o Judiciário e os demais poderes talvez seja tão importante quanto.
O principal risco político de 2019 não está na possível eleição de A ou B, mas na quase certa extrema dificuldade que B ou A terão para exercer o poder numa Brasília feudalizada e onde pululam centros alternativos de força, que só estão de acordo entre si na manutenção dos próprios privilégios. Uma democracia progressivamente disfuncional, tendente à paralisia.
Feliz 2018 a todos.
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