Os políticos e os partidos estão cada vez mais entretidos com o andar do processo eleitoral. As conclusões da Comissão Parlamentar de Inquérito no Senado da Covid-19 acrescentarão alguns bons graus à temperatura ambiente. Porém, no momento, não se enxerga potencial para os processos dela desencadeados ameaçarem amputar o mandato presidencial. Mas estamos no Brasil, então é prudente aguardar.
Enquanto isso, as forças políticas procuram agrupar-se da
melhor maneira possível, de olho principalmente nos recursos (tempo de
veiculação e dinheiro) dos partidos. É o movimento clássico a esta altura. Os
programas e os objetivos de governo ficam para depois. “Primeiro tenho de
ganhar a eleição, depois vejo o que vou fazer.” Isso não é criação ficcional,
foi dito mesmo por um pré-candidato a presidente, que infelizmente pediu off.
Por alguma razão que cabe aos cientistas políticos dissecar,
nas nossas eleições discute-se tudo menos o essencial: o que cada candidato
pretende fazer de prático para enfrentar os agudos desafios nacionais. Um bom
exemplo é a inflação. Jair Bolsonaro diz que ela é em boa medida importada e
resultado também do “fique em casa”. Os adversários dizem que é culpa do
presidente. Mas alguém sabe de alguma proposta, além de o Banco Central apertar
os juros?
E as dificuldades para o crescimento? A oposição de esquerda
diz que o caminho é revogar o teto de gastos, mas é razoável supor que se
chegar ao governo vai ser pressionada a relativizar isso. Aliás, o teto de
gastos em vigor é “à brasileira”. Ano sim, outro também, dá-se um jeito de
contornar, deixando fora do teto alguma coisa. Assim, respeita-se formalmente o
limite e gasta-se o que se precisa, ou se quer, gastar.
Entrementes, o governo tenta arrumar dinheiro para turbinar
programas sociais no ano da eleição. E não pode ser um dinheiro ocasional,
porque a despesa será permanente. O que, surpreendentemente (ou nem tanto), é
recebido com bastante naturalidade. Não se faz omelete sem quebrar ovos. Para
garantir mais quatro anos da atual agenda, aceitam-se movimentos táticos que,
em outro contexto, e em governos com pautas menos simpáticas, seriam tachados
de “populistas”.
As aparências dão a entender que Jair Bolsonaro aceitou a
ideia de o incumbente precisar concentrar-se mais na apresentação de resultados
e menos em firulas. Até quando? Na oposição, enfrenta-se uma situação
paradoxal: ela tem no momento a simpatia da maioria dos eleitores, mas sua
capacidade de mobilização anda em níveis muito baixos. Parece não haver na
sociedade um sentimento disseminado por trocar já o governo.
Isso deveria acender uma luz amarela para os favoritos, porque mostra pelo
menos uma de duas coisas, ou as duas: 1) talvez Jair Bolsonaro tenha margem
para alguma recuperação, 2) talvez haja espaço para uma carta ainda não
retirada do baralho. Mas há também a hipótese ótima para Luiz Inácio Lula da
Silva: para ele, o ideal seria que o eleitor tenha desencanado porque já
resolveu o que fazer na eleição, e ela afinal está perto.
Um problema para Lula: de todos, ele é o único que não quer
um fato novo.
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