quinta-feira, 12 de julho de 2018

A conciliação não tem mandato popular

Cada lado acha que pode eliminar o outro
Como ninguém tem força suficiente, há impasse


Uma originalidade desta eleição: ao contrário das anteriores desde o fim dos governos comandados por militares, nenhum campo político definiu ainda seu pole-position. Na esquerda, correm um ainda não designado “candidato do Lula” e Ciro Gomes. Na direita, Jair Bolsonaro e Geraldo Alckmin. Com um pé em cada barco, Marina equilibra-se ali pelo meio e consegue, até o momento, segurar os votos dela.

Fatos são fatos, e não adianta reclamar. A direita adoraria estar agora unificada em torno de um único concorrente, que já pareasse com o ex-presidente petista em intenção de voto e exercesse forte magnetismo sobre os satélites tradicionais.

A regra, desde pelo menos 2006, era um tucano mostrar-se bem mais competitivo a esta altura. E o PT preferiria estar, como no último quarto de século, no controle absoluto do voto das diversas tonalidades da esquerda.

Mas tudo na vida tem dois lados. A bagunça atrapalha cada um, mas também ajuda. A falta de definição num campo acaba retardando a arrumação no outro, deixando aberta a porta para variadas possibilidades.

Enquanto isso segue o baile, que leva jeito de querer se estender até bem perto do primeiro turno. É razoável projetar, no limite, uma indefinição até as últimas horas sobre quem passa à final. Serão fortes as emoções.

Veja-se o papel de Ciro. Ele produz incerteza sobre a presença de um “candidato do Lula” no segundo turno. Mas ao mesmo tempo impede, por enquanto, que Alckmin ganhe massa crítica, quando o agora pedetista trabalha alianças que a esta altura já deveriam estar na bagagem do PSDB. E não é absurdo imaginar que Bolsonaro também acompanhe esses movimentos com alguma satisfação. Enquanto o dito centro está dividido, ele ganha tempo e espaço para virar opção palatável.

O bolsonarismo resiliente é um problema para o PSDB, mas aqui também tem outro lado. Uma direita nítida e de raiz permite ao conservadorismo brasileiro fantasiar-se de “centro” e vender-se como alternativa moderada num ambiente de alta radicalização. O problema habitual nestes casos? Criar jacaré (Bolsonaro) na piscina de casa é arriscado, principalmente se ele cresce e passa a querer devorar quem o criou. Mas viver é correr riscos.

Claro que uma hora a coisa vai ter de se arrumar, e aí assistiremos às batalhas internas decisivas dentro de cada campo, pela vaga na decisão. Que serão provavelmente sangrentas, com a esquerda em posição algo mais confortável que a direita no caso de dar zebra. É menos problemático ao PT apoiar Ciro do que ao PSDB e demais “de centro” subirem no palanque de Bolsonaro. Mas se for preciso farão, e não seria prudente duvidar.

Especular sobre o desfecho é, por enquanto, apenas isto: especulação. Uma dúvida é sobre se no final vai prevalecer a polarização dura ou algum tipo de conciliação. A favor da segunda, o cansaço progressivo com a crise. A favor da primeira, a falta absoluta de um mandato popular para a segunda.

Cada pedaço do país está convencido de que a saída é eliminar o adversário, e esse espírito percorre a sociedade na vertical e na horizontal.

Uma razão do atual impasse é ninguém ter reunido força suficiente para realizar o desejo de eliminar o inimigo. A rigor, o país está paralisado há anos num empate catastrófico.

==========

Publicado originalmente em www.poder360.com.br

Um comentário:

  1. Estão mais interessados em eliminar uns aos outros do que em arrumar o país, perfeita a análise.

    ResponderExcluir