Desde sempre sabe-se que as eleições deste ano serão disputadas em ambiente de polarização. Até por isso ser algo tautológico. O normal é eleições acabarem polarizadas, mesmo em períodos de dita paz política, quanto mais agora. As exceções são raras. Vender o contrário costuma ser um dos muitos contos-do-vigário da política.
A dúvida nunca é se vai haver ou não polarização, mas que polarização haverá. É como no judô: quem consegue a melhor pegada no quimono adversário mais chance tem de impor o golpe decisivo. No léxico político-eleitoral, quem impõe a pauta tem meio caminho andado para finalmente aplicar o ippon no dia da urna.
A economia vem mandando nas eleições desde há muito. O PSDB ganhou duas disputas presidenciais impondo a economia como pauta central. Era o tempo em que os tucanos sacavam do Real para ter voto nos pobres. Depois o PT ganhou quatro eleições também assim: uma pela insatisfação com o PSDB, e três pela superioridade dos resultados econômicos petistas.
O establishment vinha tentando mudar a lógica desta vez. Houvesse um nome “novo” viável e compromissado com a agenda liberal, seria possível vender a centralidade de renovar a política como veículo da continuidade do programa do governo Michel Temer. Não faltaram tentativas. Mas ninguém com o figurino conseguiu até agora massa crítica.
Marina Silva e Álvaro Dias estão aí, mas a melhor probabilidade de ainda impor essa polarização continua sendo Jair Bolsonaro. Entretanto, ele estar excessivamente à direita faz o establishment desconfiar de sua competitividade. Daí a celebração em torno das amplas alianças costuradas com competência por Geraldo Alckmin.
O establishment acredita que as concessões à "velha política” talvez possam se pagar. E é sempre melhor poder apostar em dois cavalos, ou talvez três, do que depender de um só. Poderiam ser até quatro, se Ciro Gomes tivesse atraído um pedaço da direita. Mas ao fim e ao cabo a turma não quis trocar o certo pelo duvidoso. Um governo do PSDB dificilmente trará surpresas.
Não existe almoço grátis, e Alckmin carregará com ele as frustrações do governo Temer. No fritar dos ovos, ou ele ou Bolsonaro serão “o candidato do Temer” no segundo turno, com algum espaço ainda para Marina e Álvaro Dias. O “candidato do Temer” pode bem ser alguém que passe a campanha atacando o presidente, desde que incorpore a agenda temerista.
E ao “candidato do Temer” é provável que se oponha na decisão um “candidato do Lula”. Pode ser alguém do PT ou o próprio Ciro. Ou, numa hipótese mais remota, até Marina. O nome importa, mas não é tudo. Vale o caráter da polarização. E hoje ela tende a girar de novo em torno da economia e ser esquerda x direita, ainda que esta venha fantasiada de centro.
Por isso, o desafio do establishment continua mais ou menos do mesmo tamanho. Ir ao segundo turno é bom, mas o que interessa mesmo é ganhar. E como ganhar vendendo algo que indica continuidade econômica num ambiente de alta demanda por mudanças? E com um “candidato do Lula” comparando a economia atual com a do ex-presidente?
Alckmin imagina contar com o peso maciço das máquinas federal e da maioria dos governos estaduais. Isso tem se mostrado decisivo nas recentes eleições extras nos estados. Ele terá também ampla simpatia da elite. Quanto pesarão os dois vetores na disputa presidencial? Só haverá uma maneira de ir acompanhando isso ao longo da campanha: as pesquisas.
Um problema é que as pesquisas, ao menos as registradas na Justiça, têm perguntado de tudo, menos o essencial. Poucas têm medido a intenção de voto em um “candidato do Lula” no primeiro e no segundo turnos. E não têm confrontado os candidatos “do Lula” e “do Temer” no segundo turno. Numa eleição sem grandes líderes dotados de voto próprio, seria bom.
Vai ser difícil fugir dessa polarização.
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