sexta-feira, 9 de novembro de 2018

O “governo técnico” e o “presidencialismo de coerção”: as novas fantasias do imaginário político brasileiro

Todo governo é político, ainda que negue
Confiar no medo que a polícia põe nos políticos é arriscado


Algumas coisas foram mesmo novidade nesta eleição. A vitória de um candidato com pouco tempo formal no horário eleitoral, a larga supremacia da direita sobre a esquerda no segundo turno, o livre trânsito para as ideias liberais, o fim da vergonha de defender a ditadura militar. Não faltaram novidades.

Entretanto, outras anunciadas originalidades ainda precisam ser mais bem verificadas. Bolsonaro não foi o candidato de um partido pequeno, o PSL. O partido informal que o elegeu foi superparrudo, agregando ampla coalizão empresarial, religiosa e militar. E congressual. Esta foi a eleição das cristianizações.

Outra tese cuja repetição exaustiva infelizmente não chega a ser uma demonstração: as redes sociais teriam suplantado a mídia clássica. As redes foram sim vetor fortíssimo de mobilização, mas não há ainda qualquer prova de que os eleitores tenham formado convicção principalmente pelo material que receberam no whatsapp.

Por falar em repetição, outra tese bem martelada é que Bolsonaro está montando um gabinete sem olhos nos partidos. Não é fato. Estão e estarão bem representados no governo o PBR (Partido da Bancada Ruralista), o PLJ (Partido da Lava-Jato), o PMR (Partido dos Militares da Reserva) e o PEMAL (Partido da Economia Mais Liberal). Pelo menos.

Legendas não registradas no TSE, mas e daí? Quem ajuda a eleger ajuda a governar. A realidade não é refém dos cartórios. Por isso, o ministério Bolsonaro talvez seja o mais político de tempos recentes, na acepção da palavra. Claro que falta coordenar isso com o Congresso. Mas, como diria o Marcelo Adnet imitando o Geraldo Alckmin, dá pra fazer.

Pode resultar errado? Claro. Não há originalidade em apostar que as coisas darão errado entre nós. Mas é preciso esperar. Inclusive porque o Congresso brigar com o governo novo em folha nunca é inteligente. E, como se aprende em Brasília, aqui não tem bobo. Se tem algum bobo, deve ter ficado em alguma suplência, e olha lá.

Outra hipótese cuja inteligência ainda está por demonstrar é que os políticos vão aderir ao governo por medo de serem perseguidos pelo novo ministro da Justiça, Sergio Moro. Antes de tudo: quase metade dos eleitos ao Congresso não estavam ali nos últimos quatro anos. E a maioria dos reeleitos vêm atravessando ilesos a fogueira repressiva.

É ingenuidade achar que o ministro da Justiça vai mandar no Ministério Público, ou mesmo nas investigações da Polícia Federal. E mais ingenuidade ainda achar que Moro vai arriscar seu capital político operando o cargo pela lógica da impunidade seletiva. A lógica do “vota comigo que eu te protejo". Não faz sentido, para ele ou para o Planalto.

E como votar os assuntos de interesse do governo? Vamos aguardar. O governo será popular na largada e terá o orçamento. E mesmo isso pode ficar algo congelado no começo. No primeiro ano, 2003, Lula deixou para executar emendas parlamentares bem no final, quando o Congresso já tinha aprovado coisas importantes para o presidente.

Tudo pode dar errado, principalmente com o passar do tempo, mas é bom não colocar a carroça na frente dos bois.

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Publicado originalmente no www.poder360.com.br

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