Todas as pesquisas, algumas antes outras depois, vêm mostrando melhora na percepção popular sobre o estado da economia. A evolução mais acentuada é nas expectativas, especialmente sobre a inflação. Se houver mesmo segundo turno em outubro, será por esse sentimento. Toda eleição é, em última instância, uma disputa sobre continuar, porque está dando certo, ou mudar, porque está dando errado.
Mas eleição não é transformação automática de percepções objetivas sobre a realidade em votos. A transmissão não é linear, há assincronias e assimetrias. Tem gente que não vota no situacionismo, mesmo avaliando bem a situação. E tem gente que deseja a continuidade, mesmo reprovando o trabalho de quem ocupa o poder. “É a economia, estúpido”, mas ela não está sozinha no baile.
Isso fica bem evidenciado num certo atraso, ou dificuldade, de Jair Bolsonaro transformar em intenção de voto a melhora da percepção popular sobre o estado da economia. Na base da sociedade, o presidente enfrenta um cenário de apoio fiel a Luiz Inácio Lula da Silva, e o objetivo governamental aí não é sobrepujar o adversário, mas reduzir a diferença nesse principal estoque de votos. Quase metade do eleitorado ganha até dois salários mínimos.
A resistência dos pobres a Bolsonaro repousa em três fatores: 1) os governos do PT implementaram, ao longo de catorze anos, um leque de programas sociais; e, por isso, 2) não teria credibilidade o governo recorrer ao tradicional truque de dizer que, se a oposição ganhar, vai acabar com as medidas que beneficiam a base da pirâmide social; e 3) os recentes benefícios aos mais pobres só estão garantidos por lei até 31 de dezembro.
Bolsonaro vem sendo prejudicado pela percepção de que as medidas de seu governo a favor dos pobres costumam demorar, só saem a fórceps e, agora, não estão garantidas para o próximo ano. O governo pode até explicar que as dificuldades derivam da preocupação com o equilíbrio fiscal. Mas os fatos são teimosos: como, ao fim e ao cabo, ele acaba adotando as medidas, fica a impressão de ter feito a contragosto.
E isso é um veneno eleitoral.
No topo social, o problema é outro: a convicção disseminada de Bolsonaro pretender implantar um regime autoritário. Importa menos se esse fato está perto ou distante da realidade. Na política, especialmente em eleições, vale a percepção. Por ação ou omissão, o governo deixou a ideia cristalizar. E tal circunstância, ademais, oferece uma oportunidade única de o habitual adesismo, atraído gravitacionalmente pela expectativa de poder, revestir-se de desprendimento em defesa da democracia. Chega a ser irresistível.
A evolução do cenário eleitoral depende das taxas de transmissão das variações entre três índices: 1) a percepção sobre a economia, pessoal e geral; 2) como isso impacta a avaliação do governo; e 3) em que medida isso se transforma em voto. É razoável supor que a melhora no primeiro quesito impacte positivamente o segundo e, por tabela, o terceiro. Os números não mentem. A dúvida é quanto os entraves vão retardar essa transmissão.
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