O principal objetivo de todo governo provisório é perenizar-se. E todo governo é provisório em algum grau. Monarcas absolutos querem deixar herdeiros e perpetuar a dinastia. Primeiros-ministros no parlamentarismo querem reeleger-se indefinidamente. Presidentes no presidencialismo idem, quando a lei deixa. Quando não, querem mudá-la, ou emplacar o sucessor.
Michel Temer organizou o governo provisório com o objetivo de torná-lo definitivo. Para tanto, o interino precisa 1) mostrar capacidade de operar a economia em meio à tragédia fiscal e 2) mostrar que tem maioria no Congresso para executar a operação econômica. Afinal, Dilma Rousseff está bem ali, no Alvorada, à espera de qualquer escorregão.
O barco do temerismo chacoalha bastante nos primeiros dias de viagem, mas é preciso observar se isso causará rombos no casco da base congressual. A tripulação parece empenhada em chegar ao porto seguro da votação final no Senado, para afastar Dilma definitivamente.
As muitas idas e vindas iniciais precisarão ser avaliadas pelo critério da resultante política. Qual delas fará o governo provisório perder substância na sociedade (onde é apenas tolerado) ou no Congresso? Qual delas aumentará a probabilidade de o Senado não confirmar a deposição da presidente eleita?
Temer fez dois movimentos na largada. Distribuiu o governo para todos os partidos e grupos que podem ajudá-lo nesta etapa e pediu ao Congresso autorização para um déficit orçamentário que permita ao Executivo governar. Ou seja, gastar para cumprir compromissos políticos e para estancar a debacle econômica. Austeridade? Só depois.
A estratégia tenta neutralizar o ponto principal da argumentação petista, de que o temerismo veio para implantar políticas austeras, e portanto antipopulares. O plano petista parece ser a sua reinvenção como um Podemos/Syriza, um partido antiausteridade. Se não houver correpondência na realidade imediata, o petismo corre o risco de ficar, pelo menos por um tempo, falando para si mesmo e seus satélites.
Outro pilar do projeto de reinvenção do PT também pode acabar ajudando o governo provisório. Uma pitada de PSUV. O partido parece ter concluído que errou ao não tentar ampliar decisivamente sua influência sobre o Estado -incluídas a Justiça e as Forças Armadas- e sobre a chamada comunicação social. Quem não concorda com esse objetivo, tenderá no curto prazo a continuar tolerando Temer.
Essa é a teoria. A vida real recomeça agora, quando o Congresso precisa votar a revisão do Orçamento da União. Será a primeira prova prática da capacidade operacional da nova articulação política. Será a oportunidade de verificar quantos dos votos pró-impeachment na Câmara e no Senado são também votos pró-estabilização do governo Temer.
O Planalto parece ter alguma margem de segurança para os passos iniciais no Congresso. Mas há focos potenciais de problemas. Um é o duplo nó górdio da Presidência da Câmara dos Deputados, os problemas com Eduardo Cunha e seu vice, hoje interino. Outro é a tensão entre Cunha e o estratégico presidente do Senado, Renan Calheiros.
Só os fatos dirão se esses pontos de instabilidade serão suficientes para fazer desandar a receita. Em tempos normais, o Executivo teria força para moderar conflitos no Poder vizinho. Em tempos normais.
Outro ponto de atenção é a disputa no plano internacional entre o governo deposto e o provisório, em busca de reconhecimento. Se a resistência a Temer ficou até agora circunscrita, os grandes jogadores globais (EUA, China) parecem preferir esperar pela decisão definitiva do Senado. E indicam que trabalharão com quem prevalecer no final.
Probabilidades: Governo Temer com maioria absoluta (pelo menos metade mais um dos votos) na Câmara dos Deputados e no Senado 75%. Dilma definitivamente afastada 85%. Temer cassado pelo TSE 10%.
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