O governo provisório atravessou bem os testes iniciais no Congresso. Parece que o chacoalhar policial-midiático não provocou ainda rachaduras de desestabilização precoce. Aprovou um megadeficit capaz de aninhar as demandas políticas essenciais para finalizar a deposição de Dilma Rousseff e exibiu músculos na primeira votação da DRU de 30%.
A força congressual e o conforto da elite empresarial com a equipe econômica são os trunfos iniciais da administração. O governo Michel Temer sustenta-se sobre estas duas pernas: as ideias para a economia e os votos para aprová-las. O alarido é grande, mas enquanto as pernas mantém o corpo erguido o temerismo vai à frente no placar.
Focos potenciais de dúvida: a eventual substituição no comando das duas Casas e a desidratação das medidas econômicas pelo Legislativo. Mas se o governo mantiver a base suficientemente coesa terá como administrar favoravelmente ambos os problemas. Governos podem até resistir à crise permanente, mas não costumam sobreviver a perdas decisivas de apoio.
O interino enfrenta dificuldades imediatas em duas frentes: 1) as revelações e acusações criminais contra sua tropa e 2) a hostilidade do noticiário. O segundo ponto é natural para um time, o PMDB, que não tem ou tem pouca torcida nas fortalezas da guerra cultural. E o primeiro já é um dado da realidade. E a queda do PT transformou o PMDB no prato principal.
Aqui e ali pipocam no noticiário especulações sobre a possível falta de votos para afastar Dilma definitivamente. Por enquanto, devem ser lançadas na coluna dos políticos em busca de valorizar o próprio passe. Assim como as votações iniciais, a decisão final não vai depender de um ou outro senador, mas do movimento social e político na hora da decisão.
A presidente no exílio interno está bastante ativa na resistência ao afastamento e tem mantido a coesão de seu bloco. Mas até o momento não ampliou o apoio para além dos que se opuseram a seu afastamento. Por enquanto, os movimentos pró-Dilma e anti-Temer emitem mais calor do que luz. Mas convém ficar de olho.
Uma fragilidade da presidente afastada é não projetar qualquer desenho de futuro. O que seria um eventual governo Dilma, na economia e na política, até 2018? Não se visualiza. O discurso de seus apoiadores limita-se à acusação de ilegalidade e ilegitimidade. Mas não se explica por que e como a eventual volta dela ajudaria a resolver os problemas do Brasil.
É um trunfo de Temer, que se apresenta como "o governo possível". Mas sempre sob a ameaça das "diretas já", via PEC ou TSE. Alguns do campo dilmista acenam com um plebiscito convocado por ela para decidir sobre a antecipação da eleição. Soa mais um expediente para ganhar tempo, se reassumir a cadeira.
Um neoqueremismo, agora em torno de Dilma Rousseff, tem escassas possibilidades de decolar. "Plebiscito com Dilma" é uma palavra de ordem de apelo duvidoso para um país que busca, na essência, um governo que enfrente os desajustes econômicos e consiga apoio político para isso. E a Lava-Jato não chega a ser um vetor de desempate entre PT e PMDB.
A não ser, naturalmente, que alcance o presidente interino.
Assim, reafirmamos nossa hipótese principal. Se o governo provisório mantiver a base congressual e votar medidas que produzam animação econômica, tende a ser tolerado ao longo do tempo. E tende a reunir os 54 votos no Senado.
Mas, como mostra a experiência, no realismo fantástico da política brasileira nunca é demais respeitar sua excelência, o imponderável.
De olho em:
• Andamento do processo contra Eduardo Cunha na Câmara
• Novidades nas delações premiadas da Lava-Jato
• Ações da Justiça contra figuras exponenciais da República
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