segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

O Brasil vive um parlamentarismo sem primeiro-ministro. E onde está o risco

Chega a surpreender que não se detecte no cenário político nenhum movimento consistente para abreviar um governo impopular e aquém das necessidades e demandas sociais, como se vê no contexto dos morticínios nas penitenciárias do Norte.

Há sim discursos, aqui e ali, sobre a conveniência de antecipar a troca de guarda marcada para janeiro de 2019. Mas são falas voltadas muito mais para manter entretido um mercado eleitoral à esquerda do que iniciativas reais, derivadas de um desejo decisivo de ruptura.

O sinal mais evidente da ausência de vontade de mudança são as articulações para a sucessão nas presidências no Congresso Nacional. As poucas instabilidades do processo nascem da economia doméstica do Legislativo, e não de algum movimento forte contra o Executivo.

Talvez também porque o sistema político brasileiro deslizou para um parlamentarismo sem primeiro-ministro. Ou melhor, com revezamento na chefia do governo. Na semana que passou, o papel foi ocupado pela presidente do Supremo Tribunal Federal.

Desde a Constituinte, que montou um edifício parlamentarista e arrematou com o presidencialismo, o país habituou-se à tensão e à disputa permanentes entre os Poderes. Mas costumava haver certo consenso sobre o papel moderador do Executivo. Agora isso acabou.

Já escrevemos aqui sobre os riscos do cenário de ausência do poder moderador. Mas, paradoxalmente, acaba funcionando também como vetor de estabilização. Se o Executivo está muito enfraquecido, o que os outros atores ganhariam substituindo o presidente por alguém forte?

Enquanto isso, a nave vai. Há as turbulências já programadas, como os novos capítulos da Lava-Jato, com a dúvida sobre o volume da lipoaspiração que imporão ao governo. Ou a eterna esfinge do processo para a cassação da chapa presidencial no TSE.

Mas nota-se uma diferença em relação ao cenário de Dilma Rousseff. Ali, procuraram-se os motivos para derrubá-la. Agora não há propriamente uma busca. Há dúvidas sobre os mata-burros que Michel Temer precisará ultrapassar. É mais uma curiosidade, quase acadêmica.

Enquanto isso, Temer vai sobrevivendo. Onde está o risco? Na Câmara dos Deputados não parece estar, pois há uma convergência progressiva por soluções consensuais. Sem o PT e a esquerda, e sem o PSDB, qualquer iniciativa do assim chamado "centrão" tem alcance limitado.

O risco está no cansaço progressivo com a falta de luz no fim do túnel da economia. O Brasil vive os primórdios da enésima decepção com o liberalismo, depois de se decepcionar pela enésima vez com o estatismo desenvolvimentista.

Até quando persistirá a paciência social com a situação? Irá até 2018? Difícil, pois se não houver melhora os próprios políticos tratarão de catalisar a insatisfação potencial, de olho nas urnas majoritárias e proporcionais de daqui a pouco menos de dois anos.

Temer tem uma trégua, frágil mas real, até que o Congresso vote a reforma da Previdência Social. Se a votação empacar ou se a montanha parir um rato, haverá pressões entrópicas crescentes. E quando for votado, os olhos se voltarão para 2018.

*

Rodrigo Maia caminha para se reeleger à Presidência da Câmara dos Deputados. Só a Justiça pode atrapalhar. Porque nem PSDB nem PT querem abreviar o governo Temer.

As preocupações iniciais sobre um hipotético fortalecimento excessivo do presidente da República, o que o anabolizaria para uma possível reeleição, vão perdendo relevância diante dos fatos de seu governo.

E sempre houve a consciência de que as forças majoritárias só teriam a ganhar se o necessário ajuste fosse feito por um governo de transição, deixando a casa razoavelmente organizada para o vencedor de 2018.

Falta, porém, combinar com a Lava-Jato e com sua excelência, o povo. No momento, este não dá sinais de querer conflagração. E aquele está às voltas com a coesão do mundo político na estratégia de contenção de danos.

Pois a Lava-Jato é imparável no seu universo. Mas suas consequências políticas dependem também do estágio de agregação ou desagregação da política.

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