domingo, 11 de dezembro de 2022

O “orçamento secreto” no pano verde

Aguarda-se a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o “orçamento secreto”, a parcela das emendas parlamentares em que é possível identificar o destino dos recursos, mas não é pública a informação sobre que deputado ou senador incluiu a despesa na lei.

Essa decisão terá importante influência sobre as relações entre Executivo e Legislativo no próximo período, por uma razão singela: na ausência de uma base congressual própria majoritária, de origem, o governo precisará usar a discricionariedade na execução do orçamento para manter aglutinado o apoio na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.

Mas a distinção no tratamento de parlamentares situacionistas e oposicionistas pode trazer problemas legais, até por ferir o “republicanismo”, daí a conveniência de manter a desigualdade nas sombras. Há ainda outro problema: essa desigualdade se reproduz também dentro da base, pois na vida real os parlamentares só são iguais entre si na hora do voto.

Há os mais influentes e os menos influentes, a depender de cargos formais que possam ocupar dentro das Casas ou mesmo de grupos informais que comandem entre os colegas.

As circunstâncias levaram Jair Bolsonaro a terceirizar para os presidentes da Câmara e do Senado a operação dessa discricionariedade, operação que é apresentada para a opinião pública como parte da “articulação política”.

Isso não causou grande prejuízo à condução do governo, pois os últimos quatro anos assistiram a um alinhamento programático entre Executivo e Legislativo, ambos orientados para a direita. Agora devemos voltar ao cenário dos 14 anos de PT: um Planalto de esquerda precisando formar maiorias num Congresso majoritariamente de direita.

Em miúdos, se persistir a terceirização, o governo petista será limitado em seu poder de estabelecer a agenda legislativa. Daí Lula desejar retomar esse poder. Para isso precisa que o STF dê um tranco na parte “secreta“ do orçamento. Qual o problema? Pelas razões expostas, o presidente precisa que uma parte do orçamento permaneça secreta para governar.

Seria facílimo resolver o problema. Bastaria o STF decidir que 1) a apresentação e execução de emendas deve ser igualitária entre os congressistas; e 2) todo esse processo deve ser 100% publicado. Ou seja, todo pedido de membros do Legislativo ao Executivo deve ser formalizado e tornado público, e só nessas condições pode ser atendido.

Esse segundo critério poderia, aliás, ser estendido para os pedidos de preenchimento de cargos por indicação de parlamentares.

Mas isso seria um tiro na asa da governabilidade.

Ao longo dos últimos anos, e especialmente na campanha eleitoral, a oposição política e social a Bolsonaro demonizou o caráter secreto de parte do orçamento, mas agora, no governo, o PT precisa encontrar uma fórmula para sair da sinuca de precisar, ao mesmo tempo, revogar o sigilo e mantê-lo.

Lula já saiu de outras sinucas mais complicadas, e a coalizão vencedora das eleições sempre poderá recorrer ao argumento de que faz o que faz para defender a democracia. Tem funcionado. De todo modo, será interessante acompanhar como os profissionais do pano verde vão desatar esse nó.

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