E Trump está sobrevivendo à pressão do establishment liberal e da imprensa pró-democrata porque nos EUA o capitalismo está num bom momento. Os Estados Unidos atingiram na prática o pleno emprego, e em situações assim é muito difícil derrubar, nas urnas ou no braço, o candidato sentado na cadeira. Como será difícil no Brasil derrotar Jair Bolsonaro se Paulo Guedes conseguir operar o milagre de até 2022 baixar o desemprego para em torno de 6 ou 7%.
E aqui nunca um presidente perdeu a reeleição.
Mas, cuidado. Não é assim mecânico. Tabus existem para serem quebrados. A explosão da rua em 2013 se deu com desemprego baixo. Ali transbordou algo nascido da chamada frustração de expectativas. O PIB começava a perder fôlego e a inflação voltava a ficar inquieta. A boca do jacaré (as duas curvas) começava a fechar, e o mal-estar potencial foi habilmente aproveitado pelos pescadores de águas turvas, no vocabulário do presidente Ernesto Geisel (1974-79).
O Chile é outro exemplo de que tudo pode desandar mesmo quando as coisas vão bem, segundo o senso comum. Ali o problema parece não ser tanto a desigualdade, mas a injustiça. A ortodoxia sem contrapesos fez a direita subestimar a necessidade de uma mínima proteção estatal/social aos pobres, aos ditos excluídos e aos velhos. Deu no que deu. O Chile tem uma chance de canalizar o mal-estar para soluções institucionais, pela Constituinte. Vai aproveitar?
A explosão social costuma vir antes da ruptura política. No Brasil a ruptura já aconteceu em 2018, também como resultado de 2013, que depois produziu 2015/16. Daí uma certa modorra, mesmo com a escassez de resultados. O governo Bolsonaro ainda tem um tempo antes de ser fortemente cobrado pelo povão. Para a oposição, portanto, a etapa ainda é defensiva, com foco na redução de danos enquanto espera a hora de tentar virar o jogo.
Mas a boa defesa sempre embute a preparação do ataque, como ensinam os mestres do futebol. E, já que não dá para saber que fagulha vai incendiar a pradaria, o negócio é ir garimpando em todos os temas disponíveis. É o que faz a oposição, também ajudada pelas bolas que o governo e o presidente levantam todo dia, às vezes mais de uma vez por dia. E, em meio à fumaça, sempre é útil tentar enxergar, afinal, de onde virá a esperada oportunidade.
*
Vale a pena prestar atenção em como o Congresso vai reagir à suspensão monocrática do juiz de garantias. Vale a pena observar se o funcionalismo público terá poder de fogo para enfrentar a reforma administrativa. E vale muito a pena começar a olhar para as eleições municipais. Os atritos do presidente com os governadores vão valorizar algumas delas que em princípio estariam em segundo plano. Como São Luís, Salvador e Porto Alegre.
Nenhum comentário:
Postar um comentário