Qualquer oposição no Brasil costuma ressentir-se da escassez de posições de poder a partir das quais possa melhor combater o governo da hora. É diferente, por exemplo, no Reino Unido, onde além de manter um gabinete-sombra a oposição tem o direito formal de polemizar amiúde cara a cara com o primeiro-ministro nos Comuns (deputados). Ou nos Estados Unidos, onde não é habitual o mesmo partido controlar a Casa Branca e as duas casas do Congresso.
A vida de quem perde eleição no Brasil nunca é fácil, aqui funciona na prática a “regra ABBA”, the winner takes it all, o vencedor arrasta todas as fichas. Quem ganha a eleição para o Executivo leva junto os instrumentos políticos e financeiros para formar maioria no Congresso. Mais ainda quando a opinião pública apoia o presidente e/ou o programa de governo. Vê-se agora: há quizumbas, mas não há divergência real no bloco de poder sobre o que fazer.
Também por isso é fácil, e não requer muita coragem, reclamar de uma suposta inação da oposição. Acontecia nos governos do PT e acontece agora. Na vida real, porém, mais sensato é a oposição preservar forças e manter o atrito político ativo para ter musculatura quando se abrir a oportunidade prática de um caminho para virar o jogo. Nas eleições ou se cair um raio do céu azul, como aconteceu aqui em 2013 e agora no Chile.
Mas, atenção: com exceções raríssimas a parada se decide mesmo é no plano eleitoral. Que entretanto mantêm boa conexão com o extraeleitoral. Dilma Rousseff nunca se recuperou completamente do desgaste trazido por 2013. Sebastián Piñera amarga, depois de eclodida a rebelião, índices de reprovação semelhantes aos dela às vésperas do impeachment. Pena que nunca dê exatamente para saber quando e onde o raio vai cair.
A oposição tem alguns problemas adicionais. A mudança na correlação de forças entre direita e esquerda em 2018 leva jeito de ter sido estrutural. Como fora em 2002 e principalmente a partir de 2006. O PT perdeu a eleição para Bolsonaro não por uma circunstância fortuita. Ao contrário, expressou-se ali a quebra de uma aliança político-social de duas décadas e a formação de outra, essencialmente preservada após um ano de bolsonarismo.
Uma dúvida na oposição é como quebrar essa nova aliança e arrastar para si um pedaço dela. A economia, se não anda brilhante, não parece tampouco à beira de uma catástrofe. Verdade que rebeliões e terremotos eleitorais têm acontecido também em países com PIB vistoso, nos quais a sensação de que o governo promove e protege injustiças ultrapassou os limites do aceitável. Não parece por enquanto o clima no Brasil. Por enquanto.
Será que o próprio governo vai ajudar a incendiar a pradaria com as reformas tributária e, principalmente, administrativa? Bom ficar de olho.
Mas enquanto nada de diferente acontece a oposição segue nas preliminares para 2022, e começam a desenhar-se algumas opções. O debate do momento é sobre a frente eleitoral que se deve propor, mais ampla ou mais restrita à esquerda. Se a primeira proposta vingar trará uma novidade. A história do Brasil registra episódios em que a esquerda aceitou fazer parte de frentes amplas lideradas por dissidentes da direita. O inverso nunca aconteceu.
Tabus existem para ser quebrados. Mas isso requer força. Talvez a oposição precise antes de tudo pensar em como ganhar musculatura para, um dia, convencer o bolsonarismo eventualmente envergonhado ou arrependido a mudar de lado.
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