Num passado algo remoto, as eleições para as mesas do Congresso Nacional não costumavam produzir noticiário tão abundante e atraente. A rotina era o partido majoritário e governista indicar os presidentes, de seus quadros ou de algum aliado, e as demais agremiações encaixarem-se nos outros cargos conforme a proporcionalidade. E a Câmara dos Deputados e o Senado Federal estavam habituados a viver numa "harmonia subordinada" ao Executivo.
A coisa começou a mudar, ainda timidamente, quando o PT nos
anos 90 decidiu disputar com candidato próprio a presidência da Câmara, uma
tática de demarcação de limites com o então governo tucano. Mas a ação se esgotava no terreno da propaganda, acabava não tendo efeito prático, visto
que a ampla maioria governista terminava se impondo, mesmo quando vivia tensões
internas.
O caldo desandou pela primeira vez em 2005, no primeiro
governo petista, pois um racha no PT acabou permitindo a vitória de Severino
Cavalcanti (PP-PE) na Câmara. Veio uma chacoalhada, mas o mandato dele durou
pouco (teve de renunciar sob acusações de corrupção) e o governo conseguiu fazer
o sucessor, numa votação apertada. Dali em diante, o PT, gato escaldado, buscou
uma aliança-seguro com o então PMDB nos deputados.
Disso, em algum grau, também resultou a presença de Michel
Temer na vice dos dois últimos mandatos petistas. Anos depois, esse “seguro-PMDB”
não se comprovou tão funcional assim para o PT, mas aí já entraríamos em outro
assunto. Que vale a pena discutir, mas é outro assunto.
Nunca mais, porém, o país voltou aos tempos da monotonia de antigamente. E
chegamos onde chegamos. Em parte por causa da pulverização partidária. Não existe mais "partido majoritário". Mas também
porque os dois impeachments entre os quatro presidentes eleitos antes de Jair
Bolsonaro acabaram transformando o presidente da Câmara quase num dos árbitros supremos da República. Sem falar de seu poder para pautar ou deixar de
pautar os assuntos de interesse do Executivo.
É esperado, portanto, que o ocupante do Palácio do Planalto
lute para colocar aliados no comando do Legislativo, especialmente da Câmara. E
a luta eleitoral de agora foi se tornando mais cruenta na medida em que ficou
claro o objetivo dos candidatos oposicionistas: estimular a anabolização de um
ambiente favorável a colocar a corda política em torno do pescoço do presidente
da República. Esqueçam dos discursos de fachada: é só disso que se trata.
A candidatura de Baleia Rossi (MDB-SP) trouxe novidades. É um primeiro ensaio
de reaproximação entre a esquerda e a direita não bolsonarista, em alguns casos
já francamente antibolsonarista. Veremos os músculos que a aliança será capaz de mostrar neste primeiro teste de fogo. E veremos se o PT conseguirá voltar à mesa da
Câmara, claramente o objetivo principal, e põe "principal" nisso, do partido em todo esse agir frentista.
Se Rossi ganhar, a dinâmica do processo político acabará
impondo que ele abra o caminhar do impedimento de Bolsonaro. Se der Arthur Lira
(PP-AL), o governo ganha, se não um seguro (na política isso não existe em termos absolutos), pelo menos uma boa margem inicial de
manobra para: 1) respirar em meio ao recrudescimento da Covid-19, 2) negociar
em condições mais favoráveis a eventual extensão do auxílio emergencial e 3) resistir
às múltiplas tentativas de criação de CPIs.
Agora é esperar a contagem dos votos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário