Alon Feuerwerker
jornalista e analista político
bio -> https://pt.wikipedia.org/wiki/alon_feuerwerker
quarta-feira, 31 de março de 2021
Projeções
terça-feira, 30 de março de 2021
Segurança vacinal
segunda-feira, 29 de março de 2021
Linhas reorganizadas
A primeira leitura sobre as movimentações ministeriais indica que Jair Bolsonaro reagiu ao processo de esvaziamento de poder com um rearranjo que colocou nas pastas estratégicas personagens mais permeáveis a sua autoridade.
E complementou o xadrez trazendo para o Planalto um nome do Congresso Nacional, o que lhe permite construir um polo de articulação agora triangular: aos dois presidentes das casas legislativas soma-se doravante alguém também da política, mas subordinado ao presidente.
O desgaste progressivo do agora ex-ministro das Relações Exteriores somou-se à perda de influência real de Bolsonaro no ministério da Saúde. Neste caso, o ministro parece mover-se, ao contrário dos anteriores, com razoável autonomia.
Tudo ajudou a transmitir nos últimos dias ao mundo político uma sensação de fraqueza presidencial. Que atingiu ponto crítico quando o chanceler abriu uma ofensiva contra o Senado. E este reagiu dando na prática um ultimato.
As mudanças deixam evidente que o presidente tenta organizar um contra-ataque.
Ou pelo menos estabelecer uma linha de resistência. Na política, depois de trazer o PP de Arthur Lira (AL) e Ciro Nogueira (PI), e depois de instalar o Republicanos de João Roma (BA) na Cidadania, atraiu agora o PL com Flávia Arruda (DF). Vai, também, cercando aliados potenciais para 2022.
Além de, naturalmente, estabelecer barreiras de contenção para eventuais tentativas de removê-lo do cargo pela via parlamentar. Considerando que a taxa de mortalidade política dos presidentes eleitos desde 1989 é de estonteantes 50%, não deixa de ser prudente.
O desafio para o presidente é atravessar a correnteza do futuro próximo, que vai combinar péssimos números na Covid-19, um provável arrefecimento da atividade econômica (ajudado pelas medidas de isolamento social) e pressões internacionais sobre a pandemia e o clima.
Num momento em que a vacinação da Covid-19 caminha, mas está longe de propiciar a tal imunidade coletiva.
Há também as incertezas sobre movimentações sociais decorrentes do relativamente baixo (comparado com o do ano passado) auxílio emergencial, o provável crescimento de desemprego e o cansaço com as medidas de isolamento social dos governadores e prefeitos.
As mudanças indicam que Jair Bolsonaro escolheu outro
caminho que não o de ceder poder na hora do aperto. É possível que tenha feito
a leitura do acontecido com os dois antecessores que acabaram derrubados depois
de, na undécima hora, entregar os anéis.
E tem a variável da consequência das mexidas na área
militar. É a variável que ainda não está tão clara assim.
A OMS e Wuhan
sábado, 27 de março de 2021
Uma verdade inconveniente: cada governo responde em primeiro lugar a seus próprios eleitores
Fala-se muito em frente ampla oposicionista, mas por enquanto a única consolidada é uma contra a atual condução - e o atual condutor - da política exterior brasileira. Será necessário, porém, notar que a frente não é homogênea. São pelo menos duas grandes tendências. E elas irão se chocar mais adiante. Segundo a primeira, o principal erro do atual Itamaraty foi o forte alinhamento a Donald Trump. Para a segunda, o equívoco foi ter abandonado o nosso tradicional esforço pelo não-alinhamento a países ou blocos.
Parece a mesma coisa, mas não é. Para a primeira, basta trocar "Donald Trump" por "Joe Biden" e a encrenca estará resolvida. Será suficiente, por exemplo, o Brasil aceitar os ditames do Partido Democrata dos Estados Unidos para a nossa política ambiental e enquadrarmo-nos na estratégia de Washington nas mudanças climáticas. Restariam outros ajustes, mas o grosso da confusão teria sido resolvido. E a reunião global de abril convocada por Biden sobre o tema será uma oportunidade.
Vista de modo mais abrangente, essa flexão implicaria admitir uma espécie de "multilateralismo do Tio Sam". Um mundo em que as instituições multilaterais seriam a fachada perfeita para o exercício de hegemonia da maior, por enquanto, superpotência. Quase uma volta aos anos 50 do século passado. Quando, por exemplo, a Organização das Nações Unidas funcionava como "rubber stamp" do Departamento de Estado. O mundo mudou muito desde então, mas é o que tenta o governo Biden.
Ocorre que a atual crise envolvendo o Itamaraty foi desencadeada pelo problema das vacinas contra a Covid-19. Antes, o alinhar incondicional aos EUA incomodava parte do mundo político, mas como a China continua a comprar fortemente nossas commodities – até acelerou, para formar estoques, o incômodo não tinha consequências práticas. A hostilidade ao governo chinês era criticada, mas a crítica nunca chegou às vias de fato. A explosão de casos e mortes por aqui por Covid-19 mudou isso.
A cristalização de convicções sobre a centralidade das vacinas para liquidar a epidemia expôs a insuficiência da política atual. Diferente dos países dos Brics de dimensão comparável à nossa (China, Índia e Rússia), somos a única nação da tétrade a não dispor ainda de uma linha de produção própria de vacinas contra o novo coronavírus. E aí, reconheça-se, todos os governos das últimas décadas são sócios na culpa. Assim como os porta-vozes da obsolescência de ter política industrial. Agora, o governo federal e o de São Paulo correm para virar a página.
Que tenham sucesso, para o bem do Brasil.
Voltando. Se recompensar o bom comportamento fosse a regra das relações internacionais, então seria hora de ver os Estados Unidos e o resto do Ocidente retribuírem nosso recente alinhamento estratégico a esse campo geopolítico mandando para cá as vacinas necessárias. Acontece que Biden nesta pandemia segue a máxima trumpista do “America First”. Segurou o grosso das vacinas por ali. O mesmo fez o outro grande fabricante do “mundo livre”: o Reino Unido. Nem para o resto da Europa estão aliviando.
Pois cada governo é eleito unicamente pelos seus próprios nacionais. E na hora do aperto responde em primeiro lugar a eles. São a fonte da reprodução de seu poder político. Ignorar isso é um erro primário. Eis uma verdade inconveniente, como diria o ex-vice-presidente Al Gore.
E cá estamos nós a depender agora de países com quem
vínhamos arrumando encrenca gratuitamente, apenas para agradar um que agora nos
dá as costas. Serve de lição. Poderemos debater isso com mais calma depois. Mas
agora precisamos mesmo é de vacinas. E precisamos de chineses, indianos e
russos. Está exposta, como nunca, a insuficiência da atual política exterior.
Mas não só. Está provado também que trocar “Trump” por “Biden” não será
suficiente. Pois os americanos não estão mandando vacina nem para a turma da
Otan.
sexta-feira, 26 de março de 2021
Argentina fechada
A Argentina proibiu completamente os voos vindos do Brasil, do México e do Chile. Já tinha feito isso com voos provenientes do Reino Unido (leia). É mais uma medida na tentativa de se proteger das novas cepas de SARS-CoV-2. E também das velhas.
Enquanto as trágicas contabilidades da Covid-19 escalam aqui, a Argentina se afasta para trás relativamente, depois de até nos ultrapassar nas mortes por milhão de habitantes. A dúvida é sobre se haverá ali uma segunda onda. A tentativa de se proteger das novas cepas é exatamente para evitá-la.
A Argentina quer evitar ser amanhã o que o Brasil é hoje. No ano passado, fez um dos mais duros e extensos lockdowns do planeta. O resultado para a economia foi ruim, um recuo do PIB mais que o dobro do daqui. E também colheu uma primeira onda de Covid-19 longa e mortal.
Agora, procuram se proteger melhor. Faz sentido. Mas é medida de efeito limitado, não tem como ser perpetuada no tempo. Lá, como aqui, a solução é vacinar em massa e esperar que isso, combinado infelizmente com a marcha do vírus, produza a imunidade coletiva.
Vale para um país e vale para a região. No limite, vale para o mundo.
Distensão tucano-petista?
O noticiário traz indícios de distensão entre PT e PSDB. Seria algo inédito no último quarto de século, desde que Fernando Henrique Cardoso atravessou o Rubicão em 1994 e se aliou ao então PFL (hoje Democratas) para formar um bloco anti-Lula na sucessão de Itamar Franco. Foi um movimento e tanto, pois petistas e tucanos vinham próximos e haviam sido sócios-fundadores do impeachment de Fernando Collor.
Daí sobrevieram duas décadas de polarização eleitoral e
política entre as legendas. O PT derrotou o PSDB sempre que teve segundo
turno, já os tucanos ganharam duas vezes no primeiro turno nos anos 90. Mas a
dança do par acabou quando a Lava-Jato dinamitou primeiro o petismo e depois, mais
perto da eleição de 2018, o tucanismo. A força de Luiz Inácio Lula da Silva ainda
levou Fernando Haddad à decisão, mas aí deu Jair Bolsonaro.
As almas crédulas podem acreditar que ambas as
agremiações estão mobilizadas pelo ímpeto de salvar o Brasil, já os espíritos
mais céticos preferirão esperar para saber se não é apenas um enxergando no
outro a escada para voltar ao poder em Brasília. É provável que seja uma
mistura das duas coisas, mas na política a narrativa é sempre essencial. E desconfiar dela também.
Essa dita aproximação, se acontecer mesmo, vai despertar paixões.
A favor e contra.
Para buscar alguma objetividade, será preciso ir às questões
de ordem prática. Uma, simples, é imediata: petistas e tucanos apoiariam um ao
outro numa decisão de segundo turno contra Bolsonaro? Pode parecer prematuro discutir
isso a um ano e meio da eleição, e os políticos, espertos, dirão que é mesmo. Mas
é só disso que se trata. Hoje, parece mais fácil o PT aceitar esse compromisso
que o PSDB.
Até porque as pesquisas de hoje dão mais chance ao petismo
que ao tucanismo em 2022.
Eu disse que é só disso que se trata, mas talvez não seja bem
assim. Outro ponto importante: aliar-se para fazer o quê? Qual seria o programa
de um governo petista-tucano, ou tucano-petista? É fácil dizer que farão uma “frente
de salvação nacional”, mas no que consistiria essa “salvação”? Estará o PT, por
exemplo, disposto a abrir mão de suas concepções econômicas e geopolíticas, e assim fechar o
espaço para uma alternativa viável de centro-direita?
2022 vai repetir 2002?
Do lado do PSDB, há outro problema. Aquele partido com tintura
social-democrata fundado na viragem dos anos 80 para os 90 do século passado
ficou na história, e a legenda hoje tem enraizamento mesmo é no eleitorado
mais para conservador. Uma coisa é assinar manifestos conjuntos nos jornais e
na internet. Outra coisa é fazer o candidato a deputado, senador e governador
bater de frente com o eleitor dele.
Porque provavelmente o bolsonarismo vai dobrar a aposta
conservadora na eleição do ano que vem. Pois, além de tudo, o conservadorismo é a
principal força a explicar a resiliência do presidente da República em meio à
blitzkrieg política que a condução da pandemia permitiu desencadear contra o governo.
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Publicado na revista Veja de 31 de março de 2021, edição nº 2.731
quinta-feira, 25 de março de 2021
Segunda, terceira
quarta-feira, 24 de março de 2021
Ajustes
Os movimentos das últimas horas foram claros. O presidente da República procurou ajustar o discurso e a operação política em torno da pandemia, para enfrentar o crescente risco de isolamento. As necessidades da nova conjuntura foram desenhadas pelo agravamento dos números trágicos da Covid-19. E pela repercussão deles. Diante da maré crescente contra, o Planalto teve de agir.
Colocou a vacinação no centro do discurso e buscou articulação com os demais poderes e governadores. Persistem, naturalmente, os bolsões políticos de maior atrito, estimulados pelo desgaste presidencial e também, por que não?, motivados pela disputa eleitoral do próximo ano. Se vai funcionar, os dias e semanas vão dizer.
O Brasil caminha na vacina (leia), mas a propagação do SARS-CoV-2 tem rapidez própria. Vamos aguardar para saber o quanto a vacinação irá efetivamente contribuir para encurtar a duração da segunda onda. Ou até, quem sabe?, evitar a terceira. A ascendente da nova onda está mais aguda do que foi na primeira. Resta cruzar os dedos para que o declínio siga esse mesmo padrão.
terça-feira, 23 de março de 2021
Segunda turma
segunda-feira, 22 de março de 2021
Monitorar a vacinação
sábado, 20 de março de 2021
Os desafios políticos no curto prazo. E o inglório boxe da ideologia contra os fatos.
As forças políticas estão diante de desafios imediatos. Na oposição, o trágico agravamento da epidemia de Covid-19 é uma oportunidade, talvez a melhor, para tentar enfraquecer decisivamente o governo Jair Bolsonaro. Para removê-lo já, ou ao menos fazê-lo chegar a outubro de 2022 tão emagrecido que se torne incapaz de reunir a maioria do eleitorado no segundo turno presidencial, ou até impossibilitado de ir à rodada final.
A remoção imediata tornou-se mais difícil após a eleição de aliados do presidente para comandar a Câmara dos Deputados e o Senado. Mas a política não é estática, então a pressão também recai sobre os comandantes do Legislativo. Que, entretanto, podem escorar-se nas maiorias ali dispostas a respaldar o núcleo econômico da agenda governamental em troca de espaços de poder, lato sensu.
Daí certa tendência ao “morde e assopra”: uma hora agradam aos críticos, mas nunca faltam ao Planalto.
A janela de oportunidade para enfraquecer o presidente e o governo, ao menos com vistas a 2022, acabou unindo o que estava difícil de juntar: a esquerda com a direita não bolsonarista. Ainda que uma parte desta continue aferrada ao discurso de “luta contra os extremos” e prefira ser chamada de “centro”, ou pelo menos “centro-direita”. Mas tanto faz: uma parte do bloco bolsonarista de 2018 está se deslocando.
O “caminhar juntos” da esquerda com a centro-direita (vamos então caracterizar assim) na luta de momento contra Jair Bolsonaro também se alimenta da grande esperança maximalista desta última: tirar o presidente até do segundo turno. No qual, a esse grupo se apresentaria finalmente uma possibilidade material de aparecer como a tal alternativa viável aos “extremos”. Aliás, o desafio do “centro” é só esse, ir ao segundo turno.
Pois ali estaria em posição excelente para eleger-se com base apenas na rejeição ao oponente. Qualquer um.
Já para a esquerda, a ampla convergência antibolsonarista de agora é chance de ouro para o “reset”, para sair do isolamento. A elegibilidade de Luiz Inácio Lula da Silva ajuda, na medida em que desenha alguma expectativa de poder, sempre fator de atração. Mas chegará a hora em que esse mesmo “centro” voltará a brandir a “ameaça da volta do lulopetismo”. Pode ser no primeiro ou no segundo turno. É uma narrativa já contratada.
Já no lado do governo, a missão é atravessar o desfiladeiro, à espera de que a curva de vacinação neutralize, ao menos amorteça, a de mortes registradas diariamente pela Covid-19. As informações do Butantã do governador João Doria e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) são moderadamente animadoras. A política é mesmo cheia de contradições misteriosas: bate-boca à parte, o governo de São Paulo está objetivamente ajudando o federal no momento mais difícil deste.
Pois o único trunfo, ou boia, do Planalto nesta hora é a vacinação.
Mais ironias? O governo Bolsonaro faz há dois anos um esforço descomunal para desacoplar o Brasil da lógica Sul-Sul e engatar nosso vagão no que chama de Ocidente, ou “mundo livre”. Mas, no pior aperto sanitário da nossa história, só podemos contar mesmo é com chineses, indianos e, se a Anvisa deixar, russos. Ideologia é agradável, mas quando ela sobe ao ringue para bater de frente com os fatos nunca tem muita chance.
sexta-feira, 19 de março de 2021
Segunda, terceira
quinta-feira, 18 de março de 2021
Feriado prolongado
quarta-feira, 17 de março de 2021
Os números de Bolsonaro
terça-feira, 16 de março de 2021
PIB e emprego
segunda-feira, 15 de março de 2021
Com firma reconhecida
sábado, 13 de março de 2021
Mar das dúvidas
O petismo é o único que parece não ter dúvida: se Lula puder concorrer, e quiser, o candidato será ele. E, aparentemente, o PT ainda não deu sinais de estar matutando sobre os detalhes da escolha. Primeiro, vai ser preciso ter certeza de que a decisão de Fachin continua como está.
Pois o jogo ainda corre aberto, como evidenciou a parada no julgamento da suspeição de Sergio Moro pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal. E do atual STF nada que venha será surpresa.
Lula parece beneficiar-se momentaneamente de um certo “equilíbrio do terror”. Mesmo se o plenário do Supremo reverter a decisão de Fachin, continuará o risco de a Segunda Turma declarar Moro suspeito, e aí desencadear um terremoto sob os pés da Lava-Jato.
Desta vez um grande.
E com Moro declarado suspeito cairiam também as condenações de Lula.
Se a decisão de Fachin é mantida, e impede-se a Segunda Turma de prosseguir no julgamento da suspeição de Moro, salva-se (momentaneamente?) a Lava-Jato. Mas Lula fica com caminho aberto para 2022. A não ser que volte a receber condenação pelo menos em duas instâncias até lá. Difícil.
E se o STF não reverte o que Fachin decidiu, mas tampouco impede a Segunda Turma de concluir o julgamento da suspeição? Aí juntar-se-iam a fome e a vontade de comer. Qual será a probabilidade de vingar este cenário maximalista?
Tem também a hipótese minimalista. O plenário reverte a decisão de Fachin e a Segunda Turma ou não declara Moro suspeito ou simplesmente não decide nada sobre isso até que passe a eleição de 2022. Será um jeito de tirar Lula de novo da corrida.
Aguardemos. Entrementes, algumas forças políticas quebram a cabeça sobre o que fazer. O movimento mais visível é a tentativa de agrupar o “nem-nem”, os políticos que não querem nem o petista nem Jair Bolsonaro. A dificuldade aí não é saber o que não querem, mas o que querem.
Além do poder, claro.
Se bem que em outros momentos da história agitar uma rejeição foi suficiente para fazer valer alternativas políticas programaticamente nebulosas. Aliás, o Brasil está cheio de casos. O antimalufismo, por exemplo, foi vaca leiteira para muita gente boa por pelo menos duas décadas.
A dificuldade do dito centro parece residir no enigma não decifrado de 2018, e que o levou à catástrofe eleitoral: quando o gato quer caçar dois ratos, como fazer para não escaparem os dois? Desta vez, o discurso “contra os extremos” vai sensibilizar as massas?
Ou seria preferível escolher um adversário principal e apresentar-se como a melhor opção disponível para derrotá-lo? Bem, esse é um problema para os especialistas destrincharem. Enquanto isso, Lula vai agregando simpatias, ou pelo menos reduzindo antipatias, por gravidade.
E tem Jair Bolsonaro. Ele não está num momento confortável em popularidade, mas a agenda econômica parece ganhar tração no Congresso e a vacinação promete entrar em certo ritmo entre este mês e o próximo. E o Brasil inteiro quer que a vacinação funcione.
E tem Sergio Moro, que também está elegível.
E a eleição não é agora. É só em outubro de 2022.
sexta-feira, 12 de março de 2021
Concorrência benigna
Batalha tucana morro acima
Não é frequente eleições presidenciais no Brasil trazerem surpresas. De 1994 a
2014, deu a lógica, pelo menos sobre quem ia ao segundo turno, ou ganhava no
primeiro. Foram as duas décadas da polaridade PT/PSDB. Tempos nos quais os
apelos “contra a polarização” tiveram pouca acolhida no debate público e na
opinião pública. No máximo, viam-se ensaios de “terceira via”, que as
circunstâncias invariavelmente acabavam deixando na poeira.
O que mudou em 2018? Jair Bolsonaro desalojou o PSDB da
hegemonia no bloco que vai do centro para a direita. É interessante notar que a
Lava Jato acabou tendo para os tucanos um efeito mais destrutivo que para os
petistas. Varrido
do cenário nacional pouco mais de dois anos atrás, o PSDB luta agora para retomar o
posto de líder de seu campo, não sem razoável dificuldade. Uma batalha morro acima.
Os tucanos mantêm alguma expressão pelo Brasil em nível
estadual, mas à exceção de São Paulo não dá para dizer que o partido tenha
capilaridade hegemônica em nenhum outro estado. Um lugar onde mostrava algo
parecido com isso era Minas Gerais, mas ali razões históricas conhecidas
fazem hoje o PSD de Gilberto Kassab ser o candidato mais forte a ocupar a vaga
de eventual partido hegemônico. Inclusive com a participação de
ex-peessedebistas.
Situações de crise trazem oportunidades, diz o batido
bordão, e o governador João Doria luta com todas as forças para ser o
comandante da ofensiva de reconquista tucana. Teve a ousadia de sair na frente
nas vacinas contra a Covid-19 e espera colher os frutos no próximo ano. Os
fatos dirão. Um problema para Doria? É provável que daqui a um ano e meio, na
hora da eleição, as “vacinas federais” já sejam em bem mais quantidade que a “de
São Paulo”.
Doria tem um histórico de respeitáveis arrancadas eleitorais.
Aconteceu quando concorria para a prefeitura da capital e, depois, ao governo
estadual. É um argumento que ele tem usado ao ser confrontado com seus baixos
índices atuais de intenção de voto. Há precedentes também na eleição presidencial.
Fernando Henrique Cardoso em 1994, Dilma Rousseff em 2010 e Jair Bolsonaro em
2018 partiram de trás. Ainda que não tanto quanto o governador hoje.
Há, porém, uma diferença essencial entre os cenários
enfrentados por Doria nas corridas de 2016 e 2018 e a disputa pela sucessão presidencial
de 2022. O desafio ali era ocupar um espaço em larga medida desocupado. Nem
para a prefeitura nem para o governo estadual, Doria teve de lutar em seu bloco com
um Jair Bolsonaro. Os oponentes a ultrapassar eram Celso Russomano e a
incógnita entre Paulo Skaf e Márcio França.
Logo no começo do mandato de agora, Doria escolheu abrir, mais cedo do que recomenda a sabedoria convencional, a refrega com o atual presidente. Talvez tenha sido apenas por estilo, ou vai ver o governador avaliou que Bolsonaro se enfraqueceria rapidamente. A favor de Doria está o fato de as arremetidas anteriores dele terem dado certo. Contra, a também certeza de que enfrentar um presidente na cadeira costuma pedir mais frieza quando falta muito para a eleição.
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Publicado na revista Veja de 17 de março de 2021, edição nº 2.729