Há, na essência, dois caminhos para o desenvolvimento: ou o Estado recua e acredita-se que mais dinheiro no caixa das empresas resultará em mais vontade de os capitalistas investirem, ou o Estado avança sobre a poupança dos empresários e toma a si a missão de fazer investimentos que tragam bons números de crescimento e emprego.
Na vida real, a resultante é sempre uma combinação desses dois vetores, restando apenas a dúvida sobre qual prevalece. E a realidade costuma ser mais surpreendente que as leituras ideológicas: o governo Dilma investiu fortemente na primeira orientação, renunciando a receitas na esperança de ver a retomada nascer de um setor privado oxigenado.
Como se sabe, deu errado, e Dilma colheu uma desastrosa combinação de estagnação econômica, desequilíbrio fiscal e inflação. O caldo de cultura ideal para sua derrubada. Ofereceu-se a oportunidade e os adversários aproveitaram. Assim é a política. Vale a regra de Trasímaco: os apelos são aos princípios e aos ideais, mas no final chora menos quem pode mais.
E a vida segue. O governo nascido do impeachment, se tem a chance de ouro de emplacar um roteiro que as eleições vêm derrotando desde 2002, tem também um problema: ou a agenda do temerismo oferece resultados apetitosos para as massas, ou a eleição de 2018 abrirá a janela de oportunidade para a ressurreição de seu antípoda.
O lado hoje no poder sempre poderá argumentar que a dose do remédio foi insuficiente, mas o cidadão comum não costuma engolir com facilidade esse apelo de governos impopulares. A regra diz que eleitores satisfeitos votam pela continuidade e eleitores insatisfeitos votam pela mudança. E nisso, invariavelmente, a economia tem um papel central.
O debate político tem produzido muita espuma em torno da corrupção e do cansaço com os políticos tradicionais. São elementos a considerar, mas é improvável que venham a ser decisivos em 2018. O mais certo é que na reta final a polarização se cristalize entre os dois campos de sempre, com suas visões opostas sobre o caminho do crescimento.
O bloco à esquerda terá seu fardo a carregar: os resultados negativos do governo Dilma. Mas Lula não é Dilma. E o adversário poderá até aparecer com a face do "novo", mas não terá como deixar de contabilizar a herança da administração Temer. No final, a tendência é que seja a disputa entre o candidato de Lula e o candidato de Temer.
Pode até ser Lula contra Temer, ou cada um com seu "novo", "o que não apareceu na Lava-Jato". Depende de o petista poder concorrer, de Temer entregar uma economia menos agonizante e de incógnitas políticas, como quem será o nome do PSDB. Tudo é relevante, mas na hora do vamos ver o que contará será se se vota na situação ou na oposição.
Seria bom se as pesquisas, tão raras ultimamente, trouxessem a resposta a isto: "No caso de irem ao segundo turno um nome apoiado pelo presidente Temer e um apoiado pelo ex-presidente Lula, você votaria no primeiro, no segundo, depende do candidato, em nenhum dos dois ou é indiferente?"
É o número que eu gostaria de monitorar.
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Políticos são seres treinados na leitura fria da realidade. Mas a realidade é contraditória. Enquanto a opinião pública stricto sensu acena com algum alívio se apoiarem a agenda Temer, o assim chamado povão resiste bravamente a comprar o peixe das reformas. E há um problema adicional: o alívio é acenado a muitos, mas só está sendo entregue a poucos.
Isso atrapalha o ritmo das votações. Na política, entregar o prometido é a única coisa que conta. O governo tem feito a parte dele, entregando as verbas e os cargos. Mas não é suficiente. O PT e aliados têm conseguido consolidar a narrativa de que um governo ilegítimo tenta retirar direitos da população, especialmente dos trabalhadores.
Na prática, o que se oferece aos políticos é que votem contra o sentimento popular e continuem sendo execrados, inclusive pelos que exigiram que votassem a favor das reformas. Pode dar certo, mas não é trivial.
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