terça-feira, 2 de maio de 2017

Cenário projeta risco de vitória de Pirro nas reformas, e de possível figueiredização

Um exercício na análise prospectiva é especular como terminará o governo de Michel Temer. As expectativas são essenciais, garantem os economistas, então é preciso sempre tentar interpretar os futuros pontos de passagem. Um deles é a sucessão presidencial de 2018. Se soubermos como este governo acabará, teremos uma ideia aproximada do que virá depois.

Quando Temer chegou ao poder, a aposta otimista, dos dele, era um novo Itamar Franco. A maioria parlamentar garantiria a transição para um programa econômico saudável, o que permitiria ao grupo no poder sonhar com a projeção para além de 2018, talvez na pessoa do ministro da Fazenda, o condutor da mudança benigna na economia.

Mas a vida real mostrou-se mais complexa. A Lava-Jato avançou e ampliou-se, e o sofrimento político daí decorrente foi dificultando desatar o nó econômico. E as apostas de itamarização deram lugar aos palpites de sarneyzação, mesmo sem hiperinflação. Um epílogo fraquíssimo, com uma economia medíocre, e sem força para fazer o sucessor.

As amplas e maciças movimentações sociais e as últimas pesquisas de opinião, como o importante Datafolha deste fim de semana, permitem especular um desfecho algo diferente. É possível que a administração termine os dias como o governo João Figueiredo, o derradeiro general-presidente. Quem viveu, ou estudou, notará semelhanças no ambiente.

Quais os ativos de Temer? O apoio empresarial, a maioria parlamentar e a expectativa de produzir uma candidatura competitiva, capaz de defender e dar continuidade ao legado. E os passivos? A ampla rejeição social, a mediocridade econômica e a dificuldade de costurar uma saída sucessória que una todo seu campo político. Era assim com Figueiredo.

Aquele governo terminou muito mal, mas não era inevitável. Se o presidente não tivesse enfartado, se Petrônio Portela não tivesse morrido, se Aureliano Chaves fosse mais hábil ou se Paulo Maluf não tivesse derrotado Ernesto Geisel em 1978, era possível o regime ter fabricado um condutor situacionista da passagem para a democracia. Mas não conseguiu.

A história não é determinista. Tampouco o indivíduo a produz de acordo apenas com seus desejos. Ele o faz dentro de limites postos pela vida material, pelas condições reais e pelas escassas alternativas. E as opções políticas costumam até estar mais disponíveis que as econômicas. Também por isso, o erro político é sempre mais imperdoável.

Figueiredo naufragou na política, e essa parece ser um ativo de Temer. Mas, assim como no início dos anos 80, até quando o presidente manterá sua base política coesa diante da ampla rejeição a ele próprio e a seu programa? Políticos não são afeitos ao suicídio e mudam facilmente de lado, como Tancredo Neves sabia e provou ao costurar a Aliança Democrática.

Para evitar a figueiredização, não basta a Temer aprovar alguma coisa de suas impopulares reformas pró-empresariais. Ele provavelmente o fará, para premiar sua principal, ou única, base social. Mas Figueiredo ganhou a votação crítica das diretas já e menos de um ano depois o regime acabou. Porque sua vitória na emenda Dante de Oliveira foi uma vitória de Pirro.

A aprovação das reformas não será uma vitória de Pirro se descortinar um ambiente de otimismo econômico, com impactos de curto prazo no crescimento e no emprego. Mas talvez só a velhinha de Taubaté (outro personagem da época) acreditasse nisso. O provável é prosseguirmos na mediocridade. As reformas não mexem nas raízes do atraso.

Quem exige do governo que imponha suas medidas a ferro e fogo contra a opinião de sete entre dez brasileiros talvez esteja preparando um palco eleitoral em que o papel principal, à esquerda e à direita, será disputado por personagens cujo discurso será de desfazer o que Temer fez. As intenções de voto a esta altura podem ser prematuras, mas não são cegas.

Talvez o empresariado esteja certo ao tentar tirar os últimos baldes de leite desta vaca, para aproveitar o momento. Dificilmente um próximo governo conseguiria revogar tudo. Vide as dificuldades de Donald Trump com o Obamacare. E se a bichinha for abatida, compra-se outra. O problema é saber se ela topará ir em paz para o matadouro.

Para melhorar o ânimo da vaca, seria recomendável que o governo desse sinais de que conseguirá produzir um palanque competitivo em 2018, sem subordinar isso unicamente a um fantasioso impacto positivo imediato no ambiente econômico e portanto político-social. Até porque sem boas expectativas no médio prazo acreditar em otimismo no curto prazo é ilusão.

E uma informação: Em 1984, último ano do governo Figueiredo, e depois de três anos de recessão, a economia cresceu 5,4%.

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