segunda-feira, 8 de maio de 2017

A dúvida entre um político, um cavalo de troia e um de fora. E a boca do jacaré

Há dois assuntos nas plateias que pedem previsões. Se Michel Temer vai conseguir aprovar as reformas e quem vai levar em 2018. Com a primeira resposta, espera-se iluminar o curto prazo. Com a segunda, o médio e o longo. A primeira variável mantém alguma autonomia em relação à segunda, mas essa autonomia, obviamente, declina no tempo.

A queda de Dilma Rousseff trouxe para o PT a imensa desvantagem de ser ejetado da máquina, sempre uma ferramenta poderosa de reprodução do poder. Mas trouxe pelo menos uma vantagem. Ao ver-se dispensado do obrigatório realismo de uma narrativa governista, foi premiado com a possibilidade de voltar a oferecer sonhos. Eleição e sonho têm tudo a ver.

Assim é que o bloco político-social à esquerda também volta a agrupar-se em torno do PT e Lula. O partido e seu principal líder venceram a primeira etapa da luta pela sobrevivência no pós-impeachment: com a narrativa oferecida pelos adversários, a de vítima de um golpe autoritário e antipopular, o PT lipoaspirou possíveis dissidências viáveis à esquerda.

Já o PSDB abocanhou algo que estava fora do alcance desde 2003, o comando sobre gordas torneiras do orçamento federal. Mas vê a incômoda ascensão do bolsonarismo e de tensões internas que até há pouco eram do adversário. Tem alguma graça que os tucanos estejam às voltas com pressões por "autocrítica" e por "refundação".

Não convém entretanto subestimar a força de ser governo. Das onze eleições presidenciais diretas desde o fim do Estado Novo, o bloco político-social situacionista só perdeu duas: para Jânio Quadros em 1960 e Lula em 2002. E perdeu também porque a derrota dos aliados permitiria a Juscelino e FHC sonhar com uma volta adiante. Os resultados são sabidos.

Então é natural que, mesmo com o inevitável desgaste, as forças hoje governistas caminhem para aprovar alguma reforma agora. As tendências centrípetas são poderosas. Haverá diluição de metas, porque políticos não têm vocação para o suicídio, mas PSDB e PMDB sabem que a divisão da frente antipetista alargará a avenida em que Lula e o PT já trafegam.

E, enquanto seguem o enredo oferecido pela empoderada opinião pública stricto sensu, peemedebistas e tucanos são úteis aos vetores que convergiram para depor o governo derrubado. Isso sempre ajuda em tempos de uma feroz Lava-Jato, imparável na sua tentativa de remover o que considera uma crosta de políticos corruptos voltados a assaltar o país.

Cada um está portanto bem encaixado em seu papel nesse teatro, restando escolher os personagens principais: os candidatos. No PT, o candidato é Lula. Ou será indicado por ele. Se Lula não puder ser, a dúvida é se estará apenas inelegível, podendo portanto participar da campanha, ou se os adversários darão um jeito de ele nem conseguir gravar para o #YouTube.

Já do outro lado, a dúvida é se apresentará 1) um nome clássico, como o do governador de São Paulo, 2) um cavalo de troia, como os prefeitos de São Paulo e Salvador, ou 3) será obrigado, no fim das contas, a descarregar em alguém de fora, ainda que na reta final. Como aconteceu nas eleições de Jânio e Collor. Hoje eu apostaria na primeira ou na segunda hipóteses.

E o que conduzirá a eleição? No lado petista, a narrativa está pronta. Criou-se no país um ambiente de terror policial e caça às bruxas para mergulhar a economia no caos e instalar um governo dos ricos, que governa para os ricos e as potências estrangeiras. E a possibilidade de estancar essa ofensiva reacionária é eleger Lula, ou o candidato de Lula.

No outro campo, também. A situação não está fácil mas é preciso evitar a volta de um governo atolado na corrupção e que mergulhou o país na mais grave crise econômica de sua história. E se as reformas ainda não produziram resultados brilhantes é porque não foram aplicadas na intensidade necessária para estimular um novo ciclo de crescimento.

O que vai prevalecer no fim? Como disse, a tradição no Brasil manda apostar em governos. Mas a Lava-Jato ensinou que tudo sempre pode sair do script. Especialmente em épocas de grande potencial disruptivo e pouca credulidade popular. Se você precisa antecipar tendências, um caminho é prestar atenção na boca do jacaré.

Há duas curvas a observar: a sensibilidade popular às acusações de corrupção e a irritação com a mediocridade econômica. A primeira é declinante e a segunda, ascendente. Mesmo que haja soluços, essa boca de jacaré está fechando. Isso ajuda o PT. Mas se ela voltar a abrir, quem ganha fôlego é a aliança PSDB-PMDB.

Um comentário:

  1. Alon Feuerwerker,

    Um texto excelente. E não se trata de elogio de quem acha que faria texto igual. É de quem sabe não ser capaz de tal feito.

    De todo modo, o meu espírito crítico não me permitiria omitir de dizer que faltou uma referência ao Fed.

    Clever Mendes de Oliveira
    BH, 07/05/2017

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