Depois da megadelação da J&F, o governo e o presidente Michel Temer entraram no estado de imponderabilidade. Parecem flutuar mas estão caindo. Atenção: não garanto aqui que vão cair, afirmo que entraram em queda. Na política, enquanto há vida há esperança. Mas o movimento desencadeado desde a semana passada não permite dúvidas. Ele é claro.
Impopular, Temer vinha buscando legitimação no programa econômico que executa. Suas reformas não têm apoio social, mas até outro dia ele parecia vir construindo uma maioria congressual para aprová-las. Havia dificuldades, grandes mas não intransponíveis. Nada que não pudesse ser resolvido com uma boa negociação tradicional de última hora.
Na nova situação, é bastante improvável que o governo consiga impor ao Congresso Nacional a disciplina necessária para confrontar a desconfiança e a resistência _quase repulsa_ da ampla maioria da sociedade às reformas trabalhista e da previdência. Governantes precisam ter prestígio e força, ou pelo menos um dos dois em alto grau, para pedir ou impor sacrifícios.
Sem condições de manter sua ampla maioria parlamentar, e sem portanto projetar a aprovação de seu programa, o governo Temer deixa de ter outra utilidade que não seja abrir e fechar diariamente as portas do Planalto até 31 de dezembro de 2018. É pouca coisa para muito tempo. Principalmente porque o Brasil vive longa recessão, e não aceita vegetar mais ano e meio.
Se o presidente só tem isso a oferecer, qualquer um percebe que chegaríamos à eleição do ano que vem cavalgando gravíssimas tensões sociais, resultado da recessão sem fim. O que seria um prato feito para a oposição. Lembram-se da tese de deixar Dilma sangrando? Agorá é em franjas do PT que se especula sobre a conveniência de deixar Temer sangrando.
O resultado dessa projeção é não haver ainda um mínimo consenso sobre o pós-Temer. E aí ele vai ficando. Mas na imponderabilidade. Só que o relógio político não para. O bloco hoje hegemônico precisa de um nome para fazer a transição e preparar 2018. E Temer está ferido. E obviamente o PT e a esquerda não têm motivo para ajudar a montar um replay de 1994.
Eis por que _e a política é fascinante também por causa destes detalhes_ é possível notar uma convergência tática entre o temerismo na UTI e certos movimentos do petismo e satélites. A nenhum dos dois interessa um novo personagem mais capaz que Temer de manter reunido e operante o bloco liberal-conservador que removeu Dilma Rousseff e chegou ao poder.
O problema: a situação atual não é sustentável no tempo. Como _viu-se_ não era a de Dilma. De tanto cair, o corpo em imponderabilidade uma hora cai mesmo. E é improvável que o novo bloco de poder vá assistir passivamente à sua própria derrocada e à ressurreição de uma esquerda forte. Ou Temer mostra capacidade de reação política, ou será ejetado.
Já explicava Jack London no imperdível "The Call of the Wild". O líder da alcateia, quando muito enfraquecido ou muito ferido, vira uma ameaça à sobrevivência do grupo. E o próprio coletivo encarrega-se de eliminá-lo. Na política, a selvageria sempre dá as caras, e os próximos dias e semanas se encarregarão de mostrar isso mais uma vez.
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O PT e aliados partem de uma posição confortável na luta pelas "diretas já". Se der certo, Lula é forte candidato. Se não der, pelo menos evita a formação de um consenso automático em torno da solução-tampão indireta. Em qualquer cenário, o campo petista retomará um protagonismo que até ontem pareceria coisa de doido ou de quem troca a realidade pelos desejos.
A política é dinâmica, já explicavam as nuvens do ex-governador mineiro Magalhães Pinto, quando mudavam entre duas olhadelas para o céu.
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