segunda-feira, 28 de maio de 2018

A economia costuma decidir, mas é preciso sempre ter o cuidado de entender o que é “a economia”

As rupturas políticas podem acontecer quando as coisas vão mal.
E também quando melhoram e uma turma percebe que ficou de fora


O que nos diz a greve dos caminhoneiros?

Os debates sobre efeitos da economia nas eleições costumam ser orientados a partir da macroeconomia fria. Crescimento, inflação, taxa de juros, desemprego. Os grandes indicadores alimentam a planilha, mental ou digital, quando se quer saber o efeito do desempenho econômico sobre a urna, por exemplo numa eleição presidencial.

Está cada vez mais óbvio que o ditado de James Carville, “É a economia, estúpido”, precisa ser lido com sofisticação. O voto não convencional espalha-se em escala planetária, bem em meio à recuperação. Depois de ensaiar surpresas na França e na Alemanha, finalmente venceu num grande país europeu, a Itália. E a Espanha vai pelo mesmo caminho.

Cada país tem sua especificidade, mas é possível ao menos especular que o desconforto com a política mundo afora vem sendo anabolizado pela baixa esperança de que a elite política organize as coisas de modo a produzir prosperidade razoavelmente distribuída. Algumas vezes a desesperança aparece como revolta contra a corrupção, mas é bom tomar cuidado.

Uma coisa é o que se diz. Outra é o que se quer, ou sente. No próximo mês vai fazer cinco anos da explosão da nossa rua. Diziam ser principalmente para exigir melhores serviços públicos. Bem, ou os serviços públicos melhoraram demais desde lá, ou então é obrigatório concluir aquela gente toda não foi para a rua exatamente por isso.

O problema na passagem de 2012 para 2013 era a boca do jacaré começando a fechar. Crescimento econômico em queda e inflação em alta. Um ensaio incômodo de frustração de expectativas. Em 2014 o PT ainda ganharia a eleição, mas foi uma vitória de Pirro. Enfraqueceu-se demais e não conseguiu resistir quando os adversários decidiram derrubá-lo.

O novo governo petista sabia em 2015 que a economia ainda precisaria piorar antes de melhorar, e calculou estar vivo para colher política e eleitoralmente a onda positiva que finalmente chegaria. Calculou mal o timing. Os inimigos preferiram eles mesmos estar no poder em 2018, quando a bonança produzida pelo ajuste finalmente sucedesse a recessão.

O que vem dando errado no plano de quem derrubou Dilma? Um fator é a falta de coesão eleitoral. O ex-bloco governista é um balaio de caranguejos. Outro problema são as denúncias contra Michel Temer. Mas, se a recuperação estivesse de vento em popa nem a base estaria em frangalhos nem Temer politicamente tão enfraquecido pelo cerco da polícia.

Mas uma certa recuperação está sim de vento em popa. A Bolsa subiu, as contas externas foram ajustadas, o déficit fiscal parece estabilizado, o PIB vai crescer este ano e o desemprego pelo menos não está aumentando, desenha até alguma queda. Até que as pesquisas mostrassem uma anemia resiliente da direita dita de centro, havia algum otimismo.

Só que não. Não basta os números da Petrobras brilharem se isso implica aumentos brutais e sucessivos no combustível. Não basta as empresas melhorarem o desempenho se esse aumento de produtividade significa fazer mais com menos gente. Faz sentido nos balanços, mas não para quem perdeu o emprego e não consegue um ganhando pelo menos perto.

As rupturas políticas podem se dar quando está tudo mal, mas também quando as coisas começam a melhorar e uma turma razoável percebe que está ficando de fora. Destruições criativas são da lógica do capitalismo, e não adianta reclamar. Mas tampouco adianta chegar para um desempregado e dizer que ele busque se reinventar porque o passado já era.

Há bons argumentos para explicar aos operários do cinturão da ferrugem no Estados Unidos que é mais barato fabricar as coisas na China, e portanto devem se virar para sobreviver com essa realidade. Mas eles não são obrigados a aceitar a explicação, ainda mais se têm a opção de votar em alguém como Donald Trump. #FicaaDica.

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