Ela tem alguns ativos: Lula e a má avaliação do governo Michel Temer e da política econômica. E tem problemas graves: Lula está preso e ficará inelegível quando a candidatura dele for registrada. Para complicar, sem Lula e sua liderança natural cada pedaço da esquerda enxerga a janela de oportunidade para deixar a sombra do PT.
Outro obstáculo é o isolamento político. O PT e aliados venceram as últimas quatro eleições presidenciais tendo também o apoio de pedaços da direita. Hoje isso é mais difícil. O PT perdeu o governo, e sua expectativa de poder é um ponto de interrogação. E a dificuldade de convergir o progressismo também dificulta atrair quem só se preocupa em acertar o ganhador.
Uma velha piada dos anos 70, quando se debatia interminavelmente na esquerda se a tática política deveria incluir alianças com não esquerdistas mas adversários da ditadura, os na época chamados de liberais: “Sabe a diferença entre o cara de direita e o liberal? Liberal é o cara de direita que nos apoia. Direita é o liberal que não quer nos apoiar." Desce o pano.
Neste 2018, quatro décadas depois, está em falta o não esquerdista que tope aderir a um projeto político capitaneado pela esquerda. Por duas razões. O capitalismo nacionalista foi abduzido de fora ou triturado, e deixou de ter capacidade de projetar subimperialismos. E o liberalismo dito centrista virou coadjuvante e se submete à hegemonia ideológica da direita.
Agora vamos olhar para a direita.
Ela tem dois ativos: o desgaste do PT e a inelegibilidade de Lula. E tem um problema grave, além da falta de resultados populares na economia: o radicalismo abre espaço a que o PT e a esquerda voltem a ter mercado eleitoral potencial em segmentos que vinham progressivamente buscando distância de Lula e aliados. A direita também corre o risco de isolar-se no fim.
Sobre a economia, o problema da direita é a recuperação em curso estar fortemente baseada em ganhos de produtividade. Ninguém, ou quase ninguém, está recontratando no ritmo das demissões da recessão. Por isso, a retomada só é bonita nas páginas do jornalismo econômico. Quem está desempregado ou caiu degraus na escala social do trabalho não acha graça.
Outro problema: Nas últimas quatro eleições o PSDB perdeu mas manteve a hegemonia em seu campo porque conseguiu, em algum momento, apresentar-se como a expectativa mais palpável de poder. Um desafio de Geraldo Alckmin é descolar do bolo de um dígito e, a partir daí, passar a atrair os outros pedaços da direita que se vestiram de centro para a festa da eleição.
E tem Jair Bolsonaro. A resiliência dele cria um obstáculo aritmético para os desafiantes em seu campo. A velha lógica diz que ele perderá substância quando a campanha começar, pelo pouco tempo de televisão. Mas, e se a lógica tiver mudado? Como fazer? Bater nele? Nos concorrentes “de centro”? No PT? Não bater? Um desafio e tanto para o marketing.
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Na esquerda, o aliancismo lamenta que Lula e o PT estejam aferrados à tática de esticar a corda até o final e segurar o jogo. Mas, se a viabilidade da aliança depende do PT e de Lula, por que estes deveriam se submeter à lógica política de quem tem menos garrafas para entregar?
As manifestações de Lula da prisão são óbvias: ninguém está obrigado a segui-lo, mas se quiser seguir será nos termos dele, que é quem tem os votos.
Não tem bonzinho na política, outro ramo da atividade humana onde quem pode mais chora menos. E se alguém chora mais é porque pode menos.
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Talvez o mais inacreditável na história do documento da CIA sobre Ernesto Geisel, João Figueiredo e a política de extermínio de adversários políticos é o papel ser público desde 2015 e ter sido descoberto só agora, por acaso. Engenharia de obra feita, pelos outros, é fácil. Dito isso, cada um que tire suas próprias conclusões sobre o episódio.
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