quinta-feira, 7 de junho de 2018

Centro excludente é uma contradição em termos

Problema não está só na economia
Não se concilia polarizando

É preciso olhar com mais atenção para as origens da anemia do autonomeado centro. Um motivo conhecido é o econômico. Esta retomada, além de lenta, baseia-se principalmente nas exportações e nos ganhos de produtividade. Ou seja, produzir mais com o mesmo tanto de gente, ou até menos. E pagando menos. Isso não oferece melhores perspectivas imediatas para a massa que desceu na escala social durante a brutal recessão.

Mas será só isso mesmo? Reduzir o problema à economia explica tudo? Se é verdade que a economia determina em última instância a política, o “em última instância” não está aí só de enfeite. É preciso atenção às mediações. E para ver o que vai dando errado até agora vale lembrar do que deu certo antes, e buscar as diferenças. Para ficar apenas na história do Brasil, alternativas centristas só tiveram sucesso quando foram politicamente inclusivas.

O principal partido do dito centro é o PSDB. Bem, o PSDB relatou e fez aprovar no Congresso uma reforma trabalhista que, entre outras coisas, cortou a principal fonte de recursos das entidades sindicais dos trabalhadores. E o prejuízo maior ficou para os sindicatos, federações, confederações e centrais que vinham apoiando o PSDB na eterna disputa contra o PT. Não se faz omelete sem quebrar ovos, mas quebrar principalmente os próprios ovos é estranho.

O atual líder do PSDB na Câmara apresentou um projeto de lei para permitir que trabalhadores rurais sejam remunerados com alojamento e comida. Pode haver algum exagero nas muitas denúncias Brasil afora de trabalho em condições análogas à escravidão. E há. Mas uma coisa definitivamente análoga à escravidão é pagar o trabalhador rural com casa e comida. As histórias sobre o vale-barracão estão aí para ninguém esquecer.

São apenas 2 exemplos, e seria até injusto reduzir a constatação ao PSDB. Na largada do governo Michel Temer, a elite política que apoiara o impeachment de Dilma Rousseff foi arrastada pela elite empresarial e pela opinião pública ao agora ou nunca, ao tudo ou nada. Aproveitar a impopularidade do novo presidente para fazer o que, segundo as duas, precisava ser feito. Esqueceram de um detalhe: poderiam pegar impopularidade por contágio.

Sem falar na circunstância particular de o atual centrismo brasileiro ser entusiasta da prisão e inelegibilidade de Lula. Os 2 políticos ditos centristas mais bem-sucedidos entre nós foram Juscelino Kubitschek e Tancredo Neves. Ambos passaram a vida tentando não queimar pontes com os adversários, procurando trazê-los para perto. Juscelino até demais, quando apoiou a eleição de Castello Branco depois da deposição de João Goulart. Exagerou na dose.

Mas o dito centro não exclui só à esquerda. Também poda à direita, ao apresentar o bolsonarismo como risco às instituições democráticas, o que na prática significa eliminar essa força entre as alternativas aceitáveis num processo eleitoral. Não discuto aqui o mérito do argumento, mas a consequência dele junto à base bolsonarista. É mais ou menos a mesma de carimbar na esquerda o bolivarianismo, ou o risco da venezuelização.

Centro na política é só um ponto geométrico. Não tem dimensão própria. Para ganhar materialidade, precisa reunir pedaços da direita e da esquerda, e absorver pontos programáticos de uns e outros. Mas é pensamento mágico achar que vai roubar o discurso de outros e uns. Não basta juntar ideias. Tem de juntar gente, e para isso tem de saber aceitar o diferente e distribuir poder. Não existe centrismo viável sem forte inteligência emocional, sem alteridade. #FicaaDica.

==========

Publicado originalmente no www.poder360.com.br

Nenhum comentário:

Postar um comentário