quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Como as acusações de financiamento ilegal da distribuição maciça de fake news batem na eleição

É improvável que a suspeita/acusação de caixa 2 empresarial para distribuição em massa de mensagens e fake news favoráveis à campanha de Jair Bolsonaro influa decisivamente no resultado da eleição daqui a pouco mais de uma semana. Principalmente se prosseguir a atitude de distanciamento dos veículos concorrentes do que trouxe a reportagem, a Folha de S.Paulo.

Mas é provável que, caso confirmada a vitória do candidato do PSL, o caso acabe pairando sobre a nova Presidência da República como ameaça jurídico-política potencial. A primeira reação dos advogados da campanha foi sintomática. Mais ou menos na linha de “sendo ou não verdade, não temos nada a ver com isso". Ou seja, uma linha essencialmente preventiva.

Desde a proibição do financiamento empresarial de campanhas supunha-se que esta eleição veria o crescimento da possibilidade de caixa 2. Mas era uma suposição. A confirmação do delito trazido na reportagem colocará o Judiciário em sinuca de bico: tomar providências, que teriam de ser drásticas, ou simplesmente deixar para lá para não interferir na escolha popular?

Governos podem sobreviver bastante bem a denúncias cabeludas, como FHC na compra de votos para aprovar a reeleição, ou cair lá na frente por coisas feitas antes mesmo de o eleitor ir à urna, como Nixon em Watergate. Depende do quê? De duas coisas: gordura para queimar na sociedade e um belo colchão de apoio no Congresso Nacional.

A formação da base congressual custará menos para Bolsonaro que para Haddad. A ampla maioria dos parlamentares eleitos terão bem menos dificuldade de explicar ao eleitor por que apoiam um governo do PSL do que para dizer por que sustentam uma administração petista. Pelo menos dois terços do Congresso colocam-se do dito centro para a direita.

Caso confirmem-se as pesquisas e ele suba a rampa do Planalto no Ano Novo, Bolsonaro deve contar com boas facilidades no Congresso num primeiro momento. Recorde-se que até Fernando Collor, sem quase nenhuma base própria, conseguiu inicialmente aprovar tudo o que quis. Inclusive o chamado “sequestro da poupança” para combater a superinflação.

Os problemas virão com o tempo. Na França, por exemplo, após uma largada fulgurante, Emmanuel Macron sofre com índices de rejeição comparáveis aos de seu impopular antecessor. Queda de popularidade não é inevitável. Vladimir Putin que o diga. Mas é sempre a aposta mais provável, ainda mais em países com graves problemas econômico-sociais.

Aí um eventual processo de cassação da chapa Bolsonaro-Mourão poderá complicar o momentum governamental no Congresso, onde deverá estar em pleno esforço para aprovação de medidas estratégicas, como a imposição de idade mínima para aposentadoria e a unificação das regras de previdência para trabalhadores da iniciativa privada e do Estado.

Dada a atual correlação de forças políticas amplamente favorável ao bolsonarismo, é possível até que o novo poder consiga abafar e abortar o caso. Se não conseguir, a coisa ficará como uma espada pendente sobre sua cabeça. E as corporações estatais terão esse forte argumento adicional para dissuadir o novo governo de tentar atacar seus privilégios.

Pois será pouco provável que, caso não consiga matar o assunto no nascedouro, o bolsonarismo vá ter forças para enfrentar o Ministério Público e o Judiciário. Sem contar o custo político de impedir, já na largada, a formação de Comissões Parlamentares de Inquérito no Congresso Nacional. Como ficará nesse caso a promessa de “por fim ao toma-lá-dá-cá"?

Já para a provável futura oposição, o achado jornalístico, se minimamente confirmado, será o suficiente para contestar a legitimidade e a legalidade do novo poder. Será um ponto de apoio para a campanha interna e externa de desestabilização do que eventualmente chamarão de “regime bolsonarista”. O terreno na imprensa mundial já está arado.

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De todas as coisas que esta eleição vem mostrando como ultrapassadas, talvez a mais démodé seja a ideia da possibilidade de uma “frente democrática”. É prima-irmã da ilusão de haver um “centro” político, a ser disputado pela direita e pela esquerda. Ficção pura.

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Publicado originalmente em www.poder360.com.br

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