segunda-feira, 26 de novembro de 2018

“Escola sem partido” traz risco para o governo e é oportunidade para a oposição

Certas ideias infiltram-se no debate público cheias de lógica, apenas para fracassar mais adiante, por total inviabilidade. E esse percurso não é neutro, costuma lançar na coluna de perdedor quem nelas investiu capital político. Foi assim com o “controle social da mídia" proposto pelo PT. Pinta ser assim com o “escola sem partido” anabolizado pelo bolsonarismo.

O PT passou década e meia no governo falando no “controle social da mídia”, e colheu só desgaste. Não conseguiu implantar qualquer tipo de controle, mas deu gás às teses de que o objetivo último do partido é acabar com a liberdade de imprensa, como praticada em países como o nosso. Não foi só por isso, claro, mas também por isso deu no que deu.

O “escola sem partido” ensaia ser para o bolsonarismo um ponto focal de organização política e intelectual dos adversários, que agora terão a vantagem de desfraldar a bandeira da liberdade. Uma vantagem e tanto. Outra notícia boa para a oposição: ao contrário do PT e seu “controle social da mídia”, talvez haja votos para passar a coisa no Congresso Nacional.

Pois o desgaste que o novo governo vai colher com o debate parlamentar do “escola sem partido” nem se compara à corrosão que sofrerá com as tentativas de implantar na vida real, se virar lei. Em primeiro lugar, por oferecer ao STF a oportunidade de manifestar mais uma vez seu poder, e agora como guardião das liberdades e garantias fundamentais da Constituição.

Mas não só. Melhor ainda será, para a oposição, se o STF deixar passar. Aí a guerra se espalhará pelas escolas e universidades, e assim ganhará amplo espaço na imprensa. E vai ser uma guerra perpétua, pois, como no “controle social da mídia” do petismo, inexiste em projetos como o “escola sem partido” qualquer possibilidade de adotar parâmetros objetivos.

Como medir a “doutrinação” aceitável na difusão das ideias? Boa sorte a quem tentar descobrir. Um monarquista empedernido se revoltará contra a tese de as revoluções francesa e americana terem sido saltos adiante no processo civilizatório. Um socialista clássico se rebelará contra a tentativa de enquadrar o socialismo na categoria de “totalitarismo". E então?

E quando o debate passa a ser sobre religião? Uma escola vinculada a determinada crença tem todo o direito de dizer aos alunos que o critério de certo e errado, de verdade e mentira, foi estabelecido pelos textos sagrados dela. E também de informar que dúvidas sobre a atualidade das regras devem ser dirimidas com representantes da respectiva hierarquia religiosa.

Mas se, por exemplo, escolas católicas devem poder ensinar aos alunos que Jesus Cristo foi o Messias, as judaicas também devem poder contestar que não. E as de fé islâmica devem ter toda a liberdade de defender que Jesus foi apenas um profeta, e não filho de Deus, ou Deus. E se os pais não concordarem? Ou explicam em casa que não é bem assim ou trocam de escola.

“E nas escolas públicas?” Bem, aí só há duas possibilidades: 1) ou cada professor tem liberdade para ensinar ou 2) estabelece-se uma ideologia oficial. São os dois sistemas conhecidos. Toda tentativa de achar um terceiro fracassou. O “escola sem partido” só seria viável no segundo. E seria um desafio brabo num planeta digitalizado e interconectado em tempo real.

Radicalizar na agenda dita “comportamental” vai ser tentação, na impossibilidade de apresentar resultados econômicos instantâneos. Será uma maneira de manter coesa e energizada a base social do bolsonarismo, pois talvez as circunstâncias da economia obriguem a recuos nas agendas da política externa e ambiental. Mas também vai ser oxigênio para a oposição.

Assim será com o “escola sem partido”. Se o governo for esperto, dá um jeito de dizer que está fazendo e ao mesmo tempo desidrata a coisa até a irrelevância. Deixa pra lá. Mas talvez falte ao ideologicamente coeso governo bolsonarista, todo imbuído do sentido de missão, o passarinho na gaiola na mina de carvão. O que quando morre dá o sinal de perigo.

Um comentário:

  1. Infelizmente o que se discuti na educação e isso em vez de falar sobre as condições de sala de aula que nossos alunos tem sem laboratórios de informática química física bibliotecas eles vêm com essa de escola sem partidos nossos professores mal remunerados francamente e desolador

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