segunda-feira, 11 de maio de 2020

O velho Weber e o casuísmo que ameaça vir por aí

Governantes estão sempre prontos a justificar o próprio senso de oportunidade a partir da dita ética consequencial weberiana. Vendem a obsessão com o interesse deles mesmos embalada em preocupação com as consequências de seus atos para os governados.

Não se faz aqui juízo de valor, apenas uma constatação. Aliás, líderes que não se preocupam com a consequência de seus atos para os liderados costumam conduzir ao desastre. Se o próprio Max Weber tivesse vivido um tanto a mais veria a prova viva da precisão do conceito.

Voltando ao Brasil de 2020, políticos ensaiam tentar adiar para 2022 as eleições municipais do próximo outubro, marcadas para renovar as prefeituras e câmaras municipais. O pretexto é a falta de condições para realizá-las atendendo a normas que protejam a saúde do eleitor.

Será?

Convenções podem perfeitamente ser feitas, com vantagem, pelo Zoom, ou outros apps. E as votações dos convencionais, executadas online. E nossas convenções sempre se resumem a atos mecânicos para referendar decisões já tomadas pelos caciques da sigla.

E até em situação normal o grosso da campanha já seria por meios eletrônicos.

E basta impor o distanciamento para a votação presencial acontecer com bastante segurança.

E ir votar traz menos riscos que, por exemplo, ir ao mercado.

A Coreia do Sul acaba de ter eleições. Por que não fazer um benchmark, ver como resolveram o problema ali? Aliás, a pouca disposição para o benchmarking é sintomática da combinação de preguiça e arbitrariedade que parece conduzir nossos governantes nesta crise.

A Constituição brasileira determina rigidamente a duração dos mandatos e até a data das eleições. Teriam portanto de emendá-la. Isso não seria um problema maior para nossos deputados e senadores, em sua quase totalidade eleitos a partir das atuais bases municipais.

Ou seja, os deputados que precisarão renovar seus mandatos em 2022 iriam à luta naquele ano já contando com o apoio de vereadores e prefeitos que os ajudaram em 2018 e estariam devendo a eles os dois anos a mais de mandato recebidos grátis.

Melhor que isso, só dois disso.

Caso o Congresso aprove o casuísmo, a coisa ficaria dependendo do Supremo Tribunal Federal. O STF poderia eventualmente derrubar a decisão por inconstitucional, definindo que a duração dos mandatos é cláusula pétrea da Constituição.

Mesmo entre lideranças no Congresso há a semente da dúvida sobre abrir o precedente. Porque criaria as condições para, algum dia, no futuro, algum presidente da República especular com a extensão do próprio mandato a partir de uma votação no Legislativo.

Sem contar que se abriria também a possibilidade teórica de amputar mandatos.

Ou seja, prorrogar os atuais mandatos municipais seria mais uma pá de terra na colcha de retalhos da Constituição de 1988, a supostamente “cidadã”, tão celebrada quanto emendada e ignorada a pretexto de estar sendo modernizada.

E sempre estará à mão o uso malandro do velho Weber para justificar a coisa toda. Esquecendo que ele também falou em uma “ética da convicção”.

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