Neste curso coletivo de dimensões planetárias sobre epidemias, aprendemos que a curva epidêmica tem um trecho exponencial ascendente, logo no começo. Depois a subida inverte a curvatura, conforme algumas pessoas se imunizam e outras, infelizmente, vão a óbito. Uma hora chega o pico. E quando o fator “R”, o número de indivíduos que cada indivíduo contaminado contamina, cai abaixo de um, a curva começa a trajetória descendente. Numa imagem que é quase o espelho de quando subiu.
O enigma para o analista político é tentar decifrar se haverá correlação entre as idas e vindas da curva epidêmica e uma parente dela: a curva de aprovação/desaprovação dos políticos que lidam com a epidemia em cada país. Ou em cada estado. Ou em cada cidade. Quem disser que tem certeza provavelmente falta com a verdade. Ao final deste pesadelo (haverá um “final”?) poderemos ter certeza. Mas aí será trabalho para historiadores, os privilegiados que podem se dar ao luxo de fazer previsões só depois que tudo já aconteceu.
Políticos agem por instinto, e movidos principalmente (unicamente?) pelo humor do eleitorado do qual dependem. Donald Trump decidiu proibir exportações de produtos médicos necessários para ajudar pacientes da Covid-19 e profissionais da saúde. E mandou comprar/pegar tudo que fosse necessário comprar/pegar mundo afora. Para tristeza dos fãs da “globalização”, cada um só vota nas eleições de seu próprio país. E a contabilidade de mortos que interessa a Trump no ano eleitoral é a dentro das fronteiras dos Estados Unidos.
Por isso, ele combina bem o “blame game” (o esforço, por enquanto pouco produtivo apesar da propaganda, de emplacar a expressão “vírus chinês”) com uma versão mais tosca do “big stick”, versão que dispensa aquela parte de “fale macio”. E os índices mostram o presidente candidato à reeleição navegando em meio à curva crescente da epidemia nos Estados Unidos. No momento, o povo americano parece mais preocupado em sobreviver, e menos em discutir se lá atrás Trump subestimou o problema.
Por aqui, Jair Bolsonaro sofre algum desgaste por ser talvez mais teimoso. O ocupante da Casa Branca mudou o discurso e a linha de ação quando foi necessário, sem se preocupar em explicar por que alterou a rota. Assim funcionam os líderes. Bolsonaro já teve inúmeras oportunidades de ajustar o leme para indicar que se preocupa sim com o impacto da epidemia para a saúde e a vida, mas não aproveitou. Continua no samba de uma nota só, de que os efeitos econômicos da paradeira podem ser tão ou mais daninhos que os da Covid-19.
As pesquisas mostram por enquanto um desgaste para ele apenas na margem. Não está bem avaliado no combate à epidemia, mas mantém perto dele o eleitorado fiel desde a reta final do primeiro turno em 2018. Por cálculo, ou por instinto, ou por convicção, tanto faz, ele parece achar que isso será suficiente para concluir o mandato e brigar para continuar em 2022. Pode ser. Mas também pode estar subestimando o papel que o cansaço com o belicismo presidencial pode desempenhar para juntar gente contra ele até lá.
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